sexta-feira, 22 de novembro de 2013

DIÁRIO DE AULA: PSICOTERAPIA DA FAMÍLIA

A Psicologia é um ramo do conhecimento humano multifacetado, principalmente no campo da clínica. São várias e inúmeras as escolas, teorias e abordagens psicoterápicas, e isto também resvala quando o assunto é psicoterapia da família. Tal abrangência e diversidade enriquece o olhar sobre a alma humana, suas relações e vivências, mas também se corre o risco de empobrecer, mormente quando se fixa em uma única forma de entender e abordar o ser humano em toda sua complexidade e trama. Estreitar a visão sobre o tema é apequenar o que é profundo, amplo e que contém incontáveis elementos, ângulos e variáveis. 
O campo da psicoterapia familiar, mais conhecido como terapia de família, possui vários enfoques até agora desenvolvidos. Alguns deles são: a cibernética, a psicanalítica, a estrutural, a construtivista, a estratégica, a sistêmica, apenas para citar as mais referidas. Urge diminuirmos as divergências e polarizações e melhor articularmos os diferentes ramos e suas diversas contribuições. 
Falar em terapia de família é pensar a família como unidade sócio-afetiva. É uma forma de entender e tratar os problemas humanos e seus conflitos. É um método de tratamento do grupo familiar como um todo e a vincularização entre seus membros. Em termos bem gerais a família pode ser considerada um sistema cujo equilíbrio (homeostase) pelas regras do funcionamento familiar. Toda e qualquer terapia familiar é sempre aquela que se centra mais no sistema (figura) do que nos elementos individuais que o compõe (fundo). Neste sentido é um outro paradigma (para muitos um novo paradigma) onde a perspectiva é um sistema (grupo familiar) e a circularidade interativa entre os subsistemas integrantes da família. A unidade de tratamento, pois, não é o indivíduo isolado, mas o meio em que se move, isto é, a rede de relações em que ele se acha engendrado, no nosso caso específico a família. 
Na terapia de família se busca melhor reestruturar as relações familiares existentes, com vistas e experimentar e/ou superar os conflitos em loco, ou seja, no seu lugar de origem. Por esta razão, basicamente, a terapia familiar é um trabalho terapêutico focado no aqui-agora intrafamiliar. Pelo ângulo estrutural é auxiliar a transformação disfuncional do sistema familiar através de operações reestruturadoras, tais como uma delimitação mais clara das fronteiras com uma identificação mais nítida dos padrões transacionais e distribuição de tarefas. Salvador Minuchin define como uma abordagem ativa voltada para a resolução de problemas, com ênfase nas questões de hierarquia. O objetivo maior de uma psicoterapia estrutural é modificar a estrutura familiar através do modo como as pessoas se relacionam umas com as outras. Atentar que o enfoque é na modificação do presente e não exploração e interpretação do passado.
Por sua vez, enfocar o passado é analisar a história da família tando como causa do desequilíbrio como meio de transformação terapêutica. O manejo aqui é ajudar a família e seus membros a tomar consciência das repetições comportamentais do passado no presente. Para isto é necessário adentrar nos segredos e conluios inconscientes da família, na sua psicodinâmica e seus mitos, assim como os sentimentos, desejos, crenças e expectativa que unificam ou desunificam os membros familiares como um todo. O enfoque psicanalítico, portanto, trabalha com a ideia grupalista da "representação psíquica grupal", como se a família tivesse ela própria seu psiquismo, além do psiquismo individual de seus membros. 
Do ponto de vista comunicacional e sistêmico o foco de atenção é o modelo comunicacional familiar, com ênfase na transformação dos padrões de comunicação e ampliação dos comportamentos dialogais. Porém, outro olhar também pode ser dado, que é o olhar sobre as relações de poder e suas lutas dentro do âmbito familiar. O problema central é visto, pois, como consequência do jogo de poder e das hierarquias incongruentes. 
Fenomenologicamente hoje está bastante em voga o conceito de "constelação familiar", que é o método exploratório sobre a vida familiar e seus principais eventos, tais como: morte, suicídio, doenças, casamentos e separações, e situações traumáticas várias. Tal abordagem visa desvelar os emaranhamentos familiares, buscando com isso desatar nós e liberar energias a favor do crescimento do sistema familiar. 
Como visto, o campo da psicoterapia de família é vasto e necessita de articulação e síntese. Dependendo da demanda familiar pode-se escolher um referencial de compreensão, trabalho-se mais isso ou mais aquilo. Todavia, deve-se evitar a rigidez teórica e metodológica, permitindo-se uma maior elasticidade, visto que ângulos diferentes não são necessariamente excludentes. A proposta articulatória, embora ideal, é difícil, pois somos desde a graduação "induzidos" a fazer escolhas escolásticas. O partidarismo ainda impera, e muito, na academia, trazendo consequências reducionistas na prática clínica. Vejo isto na faculdade que leciono quando um aluno ou outro diz: "vou fazer analítica", "vou fazer gestalt", "vou fazer ACP", "vou fazer TCC"... E por que não dizer: "vou estudar e fazer psicologia"? 


Joaquim Cesário de Mello

Nenhum comentário: