domingo, 22 de abril de 2018

A ALMA HUMANA: uma viagem ao interior do psiquismo e suas raízes



A alma humana

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(*) direitos autorais cedidos para compra de brinquedos educativos à instituição de caridade.

A SUAVE DELICADEZA DAS MINHAS INQUIETAÇÕES



        


    
        Minha pele tem dupla face: aquela com que me visto e aquela sob a qual habito. Abaixo de ambas existe uma profundeza enorme que muitas vezes me assusta. Sou quase todo uma latência que pulsa nos estremecer dos meus mais pequenos e mínimos gestos. Aquém das superfícies nada sei de serenidades. Acaso pudessem as pessoas me conhecer o que achariam era um inesgotável e buliçoso inverno.

                Porque me inquieto eu sonho; porque sonho não sou. Não sendo, penso-me. Pensando, vejo-me; vendo-me, me surpreendo. E me surpreendendo me indago. O que posso ser de mim, o que ainda não fui? Sou aquele que não sou? Ou serei apenas aquele que não conseguiu ser? Se sou assim tantos, então quem sou de fato eu? Minhas labaredas internas não me queimam, porém me aquecem. Meu inverno interno não é feito de chuvas e trovoadas, mas de mansas nuvens em movimento. Sim, isto sei quem sou: uma nuvem entrajada de mim.
Resultado de imagem para contradição humana                Nos anos 80 passados Cacaso musicou os seguintes versos, celebrados na voz de Sueli Costa: quem me vê assim cantando/não sabe nada de mim./dentro de mim mora um anjo/que tem a boca pintada/que tem as unhas pintadas/que tem as asas pintadas/que passa horas à fio/no espelho do toucador. Mas dentro de mim não moram anjos nem demônios. Dentro de mim mora um céu inteiro. Sou o meu sol, minha lua e minhas estrelas. Sou meu próprio paraíso e meu inferno. Sou infinito enquanto não findo. Sou eu mesmo meus arcanjos, meus querubins decaídos e meu Éden. E no transitório celestial de mim sou pagão, ateu e cristão. Sou uma profunda contradição que anda de roupa por aí. Quem me vê assim cantando, não sabe nada de mim.
                Na clareza dos seus mistérios, o homem se encontra e se traduz. O dialeto da alma é diferente de todas as racionalidades humanas. A língua de fora exclama, enquanto a de dentro estala. Talvez esteja certo Pascal quando diz que o coração tem razões que a própria razão desconhece”.
                Nossa mais verdadeira existência não transita pelas ruas e praças, pois é nos quartos e becos onde reside o existir e suas autenticidades. O eu da alma não foi feito para claridades, porém para as sombras privadas dos fundos. Nas abissais profundezas o eu se dissolve na liquidez de um oceano cósmico. O que entendemos de eu – como ensina o Budismo – é uma ilusão construída pela mente. O que pensamos que somos, pois, nada mais é do que resíduos de nossas sensações, percepções e sentimentos. Para fora terminamos; para dentro somos infinitos e eternos.

Resultado de imagem para platão, biga                Freud nos dizia que somos um cavalo montado por um cavaleiro. Somos ambos. O cavaleiro conduz a força do cavalo com suas rédeas, sem elas o cavalo conduz o cavaleiro. Solto de mim que riscos corro do que serei? A força que trago necessita ser domada, afinal sem dono dispararia para bem distante de mim. Por isto entendo mais uma vez Fernando Pessoa (Bernardo Soares) quando escreve que porque sou do tamanho do que vejo e não do tamanho da minha altura”.
                  Ah!, não me venham com cavilações e prosopopéias, meus caros senhores. Meus interiores não são construídos de carnes ou vísceras, mas sim de quimeras e desejos. Por isto é que me sinto quando me sinto desperto para dentro na impalpabilidade vulcânica de todos meus inconsumos.
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 Transpiro versos como quem faz prosa. Grito silêncios nos entremeios dos meus sussurros. Meu sabor é doce por detrás do azedo e amargo em lugar de ameno. Já cantava Caetano que “cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é...”. Apenas eu e somente eu sei dos meus encantos e desencantos, das minhas paixões e dos meus ardores. Minhas inquietações são mansas e porque mansas são imensas. Não me assossego nem um instante, nem quando pareço calmo, pois pacato e pacífico sou todo inquieto.
        
                       Quem me vê assim cantando não sabe nada de mim...

         Joaquim Cesário de Mello 


domingo, 15 de abril de 2018

A Prosa Científica



Há uma discussão nos meios acadêmicos de que a narrativa da ciência tem que se afastar das “imprecisões” e das prolixidades do texto de ficção. A alegação é simples: deve-se trazer a ideia, o pensamento, a “questão”, da maneira objetiva, livrando-se das ambiguidades e das alegorias da prosa literária. Imagino que aquele que pensa a ficção com "recheios" desnecessários, teve pouco acesso aos seus textos, talvez tenha lido apenas na adolescência, nos tempos que se cumpria as obrigações de colégio, e que nos deixou como  legado o ódio à literatura de ficção. Desnecessária e inventiva, a ficção foi jogada no campo da mentira e fora da verdade científica.

Estava numa livraria, procurava um livro, e enquanto o livreiro pesquisava, encontrei outro. Trouxe os dois, o segundo, vindo ao acaso,  li primeiro. Por quê? folheei-lo e observei-lhe algumas palavras, frases avulsas e talvez por sorte, li ainda no prefacio a passagem: “Pois não há contradição radical entre a Sociologia e História, mesmo quando a História deixa de ser de revoluções para tornar-se de assombrações”. O livro Assombrações do Recife Velho, editado pela primeira vez em 1955, fora escrito por Gilberto Freire. Poderia ter deixado o livro na prateleira, mas tinha que comprá-lo, era injusto não fazê-lo, a frase o havia comprado e ainda me convidava a explorá-lo.

Escrever sobre assombrações num livro de sociologia provoca discussões sobre o texto “científico”. Para validá-lo teria que tratá-las como superstições ou crendices, e se submeteria a contensões e mutilações da academia. Mas Gilberto Freyre surpreende, faz diferente e traz um texto que poderia ser narrado em primeira pessoa, haja vista sua estrutura prosaica, que faz com o leitor mergulhe no ambiente dos contadores de histórias de malassombros. Um texto que na academia seria interpretado como por demais reflexivo, opinativo ou digressivo.

Os pesquisadores se transformaram em operários do pragmatismo e, consequentemente, do texto insosso - arrisco em dizer que isso ocorre na própria literatura de ficção, quando os críticos sustentam frases como: “uma linguagem seca, econômica, enxuta etc.”.

Gilberto Freyre me fez esquecer essas querelas ao permitir ousadias ao construir, assim como os autores do século XIX – por que não? – frases elegantes, eventualmente, irônicas ou descritivas. Em "Assombrações do Recife Velho", os acontecimentos não são apenas descritos ao leitor, mas narrados na dimensão de uma experiência subjetiva, algo como se o texto tivesse escrita exclusivamente para aquele que o lê, de certo modo tornamos seu personagem. Textos como esses  fazem com que Gilberto Freyre e suas assombrações, reedite o clássico axioma de Barthes: "saber com sabor", e, mesmo, com falta de rigor científico, pisoteiam teses e dissertações que mofam nas prateleiras das universidades.

Marcos Creder

domingo, 1 de abril de 2018

O "Idiot de Savant" da atualidade



Provavelmente a maioria dos leitores desconhecem a expressão utilizada no passado “Idiot Savant”. A palavra “idiot” por si só já é sugestiva: refere-se ao “idiota” palavra que no passado categorizava um tipo (grave) de retardo mental e que hoje tem uso pejorativo. Já a expressão “savant” na língua francesa  significa “sábio”. Como assim, um idiota sábio? Parece contraditório relacionar essas duas palavras uma vez que se for sábio não se pode ser idiota. Não é bem assim, leitor. Há sim alguma sapiência, mesmo que estéril, nos deficitários. Quando os franceses criaram essa expressão quiseram se referir à excepcional sabedoria que há nos transtornos do espectro do autismo, especialmente no transtorno de Asperger. Há neles, eventualmente, capacidades intelectivas extraordinárias, geralmente envolvendo habilidades específicas, como  a capacidade de realizar cálculos numéricos complexos, facilidade no aprendizado de línguas estrangeiras ou memorização de textos. Contudo, faltam-lhes a capacidade afetiva e associativa suficientes para julgá-los inteligentes no sentido mais abrangente dessa expressão. Esse tipo de habilidade nos cativa pela peculiaridade e pelo descompasso que há entre o saber e a maturidade intelectual do sujeito.


Como funciona a mente de um Idiot Savant? Arrisco-me a comparar - e quando comparamos sempre incorremos em erros - essa modalidade de saber com uma entidade tecnológica virtual: o Google (ou os buscadores da internet). A astronômica capacidade de armazenamento de dados dessa ferramenta, que tudo nos informa, mas não sabe o que diz, é extraordinária. Se ponho uma palavra no Google, sua rede de algoritmos pode redigir meus questionamentos, antes mesmo da conclusão da frase. Maravilhoso!.  Falta-lhe, contudo, habilidades afetivas e, principalmente, os elementos afetivos do raciocínio. O Google sem mediadores é deficitário e, especialmente, criador de equívocos. Equívocos que dominam a internet. Esses equívocos vem formando uma nova forma de savantismo. O sábio tecnológico, o sábio virtual, cuja a expressão afetiva geralmente é dominada pelo ódio e pelo ressentimento. Esse novo tipo de savantismo, raso de consistência, radical em conceitos universais, extremistas em defender seus preceitos, tem severas dificuldades de se relacionar com o outro -desses sábios surgem os Haters.  Se, por outro lado, procuramos uma informação, há sempre um expert que nos ensinará os pormenores de um determinado tema. Se nos utilizarmos dos dados, por exemplo, de como eu posso guiar um avião, um navio, um submarino nuclear, aprendo, mas (felizmente) não executo - eis aí o nosso savant tecnológico. São filósofos, antropólogos, cientistas sociais, astrônomos, críticos de arte, escritores, cientista, articulistas, jornalistas, músicos.

Observando assim tanta fartura de conhecimento no mundo atual, utilizo-me de uma frase de Nelson Rodrigues ao assistir uma adaptação de uma de suas peças em São Paulo: Sejamos burros.


Guilherme Leão