sexta-feira, 16 de agosto de 2013

VALE A PENA VER DE NOVO

KEVIN E O CINEMA PERTURBADOR


A tarefa mais árdua de quem vai comentar  um filme ou um livro é descrevê-los sem, contudo, escorregar e contar o final, quando esse foi o fundamental recurso que o escritor ou cineasta teve para   trazer o leitor/expectador para a trama que quis levantar. Confesso que tenho pouca habilidade nisso, principalmente, quando me entusiasmo por finais surpreendentes. Quanto a surpresa em si, a que mais me chama atenção é aquela que nos diz o tempo todo o que sabíamos o que iria acontecer, mas algo nos impediu de aceitar o óbvio – como diria Nelson Rodrigues óbvio é o elemento mais difícil de ser aceito.  Como venho falando em outros textos somos todos tentados pelo desejo, o bom desejo.  Criamos, em verdade, roteiros na nossa cabeça para que os finais obedeçam concomitantemente o que queremos e o que seria estética e eticamente corretos. Um filme como Bastardos Inglórios – um dos melhores finais surpreendentes que já assisti, traz um misto do previsível e o desejável. Interessante que mesmo assistindo filmes históricos temos uma tendência a querer, por alguma razão, perverter o final que já foi nos contado e acontecido.  Esse disparate Quentin Tarantino conseguiu fazer muito bem. Tarantino ridiculariza o querer do expectador.
Mas não era de Tarantino que queria falar, e antes que fale do final de Bastardos Inglórios, quero aqui recomendar outro filme. Precisamos falar dele, ou melhor, Precisamos Falar sobre Kevin - este é seu título. Alguns créditos são importantes: a diretora escocesa ,Lynne Hamsey   tem 42 anos e 5 filmes, três curtas e dois longas. Pouca coisa? Sim, se não contássemos que  tem cerca de 20 prêmios e 11 indicações internacionais de filmes com nomes em sua maioria  desconhecidos ("O Lixo e o Sonho" e "O Romance de Morvern Calla")... mas falemos sobre Kevin.

 Andei compilando os comentadores e muitos usam as expressões: perturbador, surpreendente, inquietante, soturno – muitos dos que assistiram em Cannes, recusaram assisti-lo até o final – o que acho um exagero.  O filme é simples, com um roteiro preciso e uma fotografia maravilhosa.  Ao contrário do que poderia se imaginar o filme restringe-se em contar uma historia. Não há chavões, não há explicações bombásticas– isso talvez seja o elemento mais perturbador – tampouco não se aponta soluções. O filme não vai questionar os psicologismo oportunistas e as teorias explicativas sociais. Não há interpretações.  Vai silenciosamente mostrando cena atrás de cena, diálogo atrás de diálogo, o comportamento de uma criança bizarra, Kevin, até adolescência, sua relação com os pais e com o mundo.  O desenrolar da trama –que não direi – poderia reunir, na vida real, um sem número de discussão entre especialistas, psicólogos, psiquiatras, psicanalistas. A diretora, contudo, embora não explicite, parece querer atropelar todos esses discursos prontos, mostrando o surpreendente – o fato singular, a idiossincrasia. O filme termina e a pergunta continua: “Precisamos falar sobre Kevin”. Palavras que precisam ser ditas, mas que não se sabe quando ou se serão um dia  possíveis de serem expressadas.  Se o texto está obscuro, recomendo que assistam.
(originariamente publicado em 11/11/2012)

Marcos Creder

4 comentários:

Andressa Costa disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
literalMENTE disse...

Ué, por que?

Andressa Costa disse...

O filme é incrível, fiquei bastante perturbada ao final do longa metragem. Lembro que passei uns dias precisando falar sobre Kevin. Não encontrei quem já tivesse assistido tal obra. Recorri ao google e nenhum comentário para mim dizia respeito de fato a Kevin, talvez a obra cinematográfica, mas não a Kevin. Há cenas instigantes no filme que me lembraram as aulas de Joaquim sobre a relação mãe-bebê... vi nesse texto ao ler o título uma forma de finalmente conseguir um diálogo sobre ele, no entanto, o autor sabidamente optou por não entregar a história. Enfim... Não consegui falar sobre Kevin, mas assisti algo intrigante.

Anônimo disse...

Vi esse filme, 6 vezes! - Solo, acompanhado de minhas filhas, e de novo acompanhado por minhas filhas, com amigos da escola, com colegas de trabalho.
E, mais uma vez solo!
É o primeiro filme da minha coleção, ao lado de Elephant, filme de Gus Van San (2004).
Sempre indico a todos que apreciam uma obra de arte fantástica, sem borrões!
Precisamos falar sobre o Kevin.