Notei que quem estava a montar minha máscara não era eu, mas sim um outro. Ele moldava o gesso aos traços do meu rosto à sua vontade e aos limites da minha face. Ela seria o resultado do nosso encontro e o produto seria fruto de nós dois.
Várias camadas foram colocadas sobre minha pele. A primeira foi fria e causou desconforto, mas logo me adaptei, pois era leve. As seguintes iam se destacando em relação ao peso, porém o frio não era tanto e estava mais acostumada com a sensação que elas proporcionavam. Ao longo do processo sentia-me mais afastada, mais interiorizada. Algo estranho estava se formando no meu rosto, destacava-se, distanciava-me. Já não estava mais a vista. Escondida sob uma montanha de gesso sentia-me a vontade, arrisquei até uma dancinha com os braços, claro que com cuidado para não machucá-la.
Com o passar do tempo tive que me concentrar na respiração. Às vezes ficava ansiosa. Sentia-me presa. Voltava os pensamentos para a respiração e procurava confiar no meu colega. No entanto, ele cometeu uma falha: estava tampando meu nariz. Quando adicionou mais uma camada a essa região percebi que aquela pequena passagem de ar foi interrompida e comecei a sufocar. Passei a respirar com mais força, mas não havia ar. Os outros integrantes perceberam e após poucos segundos abriram um pequeno buraco e pude respirar novamente. Contudo, nesse meio tempo não fiquei nervosa. Respirava fundo para tentar abrir uma passagem pela lateral e esperar alguma solução. Pensava apenas em não arrancar a máscara naquele momento, pois a estragaria. Ela já pertencia a mim e eu a ela.
A fase final do processo foi particularmente interessante. Outro membro do grupo veio ao meu ouvido e sussurrou uma série de frases. Pedia que fizesse alguns movimentos com o rosto, que tocasse calmamente a máscara e sentisse que aquilo não era mais eu, era qualquer outra coisa criada a partir de mim. Foi aos poucos a soltando de minha pele e disse que da mesma forma que a construí poderia me desfazer dela, não pude me conter e as lágrimas rolaram.
3 comentários:
E eu, que participei da construção da sua persona sem nem te tocar?
Bote fé! Muuuuuuuuuuuuito bom! Parabéns, Crispim!
Obrigada Francy.
E Cayo, você me tocou, assim como os outros, de uma forma que vai além do tato. :)
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