domingo, 6 de setembro de 2015

Família atrás da porta




As vezes me pergunto por que as produções  cinematográficas nacionais estão, em geral, tão distantes, do ponto de vista de qualidade, das produções internacionais. E não precisa ir muito longe para essa constatação, filmes argentinos, por exemplo, tem se mostrado na maioria das vezes superiores aos brasileiros e o argumento da falta de recursos, dos custos das produções nem sempre justificam essa má qualidade. Em verdade, o que vejo, muitas vezes, é falta de talento mesmo, e, paradoxalmente, parece que quanto mais se gasta recursos, mais precários são os resultados . Um filme como O Lobo atrás da Porta, uma produção de baixo custo, é  uma exceção de filme de boa qualidade do nosso cinema. Tem boa montagem, excelente texto e roteiro, e boas interpretações – fato raro no nosso cinema, pois falta cuidado nas  direções.    Mas nem sempre nosso cinema foi assim.  Na época do dito Cinema Novo,  o Brasil foi referência de estilo e de uma geração de cineastas. Glauber Rocha, Nelson Pereira dos Santos, Arnaldo Jabor, Cacá Diegues, nos anos 1960 e 1970,  levaram boas produções e reconhecimento  aos festivais internacionais. O Pagador de Promessas de Anselmo Duarte conquistou a Palma de Ouro no Festival de Cannes em 1962, único filme nacional  a receber essa premiação. Apesar de muito dessas produções,  já terem sido desgastadas pelo tempo – muitas fórmulas foram datadas – não  se pode argumentar que o Brasil não tem tradição de cinema.  Penso  que o legado deixado do Cinema Novo ou do  cinema  “de arte” brasileiro, foram bastante positivos nesse reconhecimento internacional, e na formação e amadurecimento de profissionais. Acredito, contudo, que o nesse legado pode ter trazido, por outro lado,  algum aspecto negativo. Percebo um certo pedantismo de alguns cineastas brasileiros influenciados pelo cinema desses anos. Muitas vezes o resultado desse pedantismo é uma caricatura ou uma farsa do que foi o cinema final do século XX. Ou se faz filmes cerebrais,  "cabeças”, com forte entonação teatral ou se faz um cinema puramente comercial,  que ganham boas bilheterias,  com comédias rasteiras.


Falo disso tudo porque assisti por esses dias a um filme norte-americano que muito me agradou. Na verdade,  seu título foi quem me fez remeter ao cinema nacional: Álbum de Família.  Na década de 1980, suponho, assisti ao filme homônimo baseado na peça  de mesmo nome de Nelson Rodrigues. Naquela ocasião me agradei, embora que, se assistisse nos dias de hoje, poderia fazer um julgamento diferente,  justamente por apontar alguns  dos vícios do cinema brasileiro. Mas naquele filme, o  que me impressionou foi o fato de que  seguindo à tradição do  teatro rodrigueano, há paulatinamente um descortinamento de dramas e tragédias familiares que se vê  apenas nos recônditos do desejo. No filme americano, com proposta de roteiro  diferente, observa-se, no entanto, um semelhança na construção do drama familiar. Este se mostra  mais sutil que aquele, sutileza que ao  invés de atenuar, intensifica os níveis de  realismo  e de crueldade. Há elementos de tensões familiares, segredos, desejos incestuosos, sentimentos de fracasso, ou falsas realizações que os dois filmes questionam,  mas que no filme americano se mostrou, no meu entendimento, mais eficaz.


O filme tem um elenco primoroso,  direção impecável e cenas impagáveis.  Há uma que destaco que me foi extremamente marcante, o dialogo estabelecido num almoço em família. uma cena que poderia ser enfadonha por haver vários discursos se entrecortando. contudo o resultado, foi ótimo,  haja vista a qualidade do texto, da construção dos personagens e da interpretação dos atores. Álbum de família, que passou timidamente nos cinemas, surpreende pela forma como os personagens vão - não poderia esquecer de Machado de Assis -   mostrando paulatinamente "o legado de suas misérias"

Marcos Creder .  

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