domingo, 1 de janeiro de 2017

FELIZ ANO NOVO, DE NOVO.

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Coube a mim o destino de postar nosso primeiro texto neste 2017 que ora se inicia. Particularmente não sou lá de réveillon e nem de abraços efusivos ao chegar no zero da contagem regressiva de dez. Convencionamos achar que um novo ano nasce no acordar do seu inovado primeiro dia. Formalidades e crendices à parte a vida segue, apenas continua. Como diz Ferreira Gullar em seu poema sobre a morte de Clarice Lispector, "as pedras, as nuvens e as árvores/no vento/mostravam alegremente/que não dependem de nós". O universo não está nem aí para nós. O sol, as estrelas, a Via Láctea, as galáxias e o que mais houver  muito além disso é totalmente indiferente as pequenas mazelas e alegrias miúdas de nossa mais completa insignificância. O bioquímico Jacques Monod afirmava que o "homem sabe finalmente que está só na indiferente imensidão do Universo, de onde emergiu por acidente". Somos uma espécie de minúsculo resíduo salivar de uma cuspida cósmica qualquer.
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Aff, isso é lá coisa que se diga logo no primeiro dia de um ano que mal se iniciou. Hoje é dia de começar a realizar as promessas das noites anteriores. Mas hoje, provavelmente, começaremos novamente a dilatar nossos velhos adiamentos. Por que adiamos? Por que permanecemos a procrastinar ações e sonhos? Por que somos seres que nos delongamos tanto? Uma explicação plausível reside na ideia que tais protelações funcionam como defesas emocionais e psíquicas contra conflitos e angústias existenciais. Será? É possível. Difícil para o ser humano, além de sua pequeneza diante da grandiosidade universal, lidar com a finitude, posto que é chama. A terminalidade certa de nossa existência encobre-se com ilusões de perenidades, Adiamos coisas na vida como quem vive na eternidade.
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Parafraseando o poeta e cronista Affonso Romano de Sant'Anna, adiar preserva a miragem do finito mais longe, bem longe, e assim vive-se na aparência da superfície plana por onde deslisamos como se não houvesse nenhuma beirada, nenhum abismo. Sair do espaço resvalante e entrar no tempo, diz o referido cronista, "é descobrir outra dimensão além dos dedos da mão" é entender que a linha da vida não é uma reta inacabável e aceitar a curva. Há muito deixei de ser imune pela eternidade. A casa do meu avô, embora ainda lá continue, não é mais a casa do meu avô. Por lá residem estranhos. Nem sei onde fica o jazigo onde enterraram o pó do meu avô.
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Pode parecer paradoxal à princípio adiar a realização de sonhos, desejos e o alcançamento de satisfações. Intriga, pensando assim, porque acabamos "escolhendo" viver a vida em estado de constante frustração. Sim, frustrações são inevitáveis; porém muitas delas podiam não existir. Muito do que podemos ser e ainda ser podem ver a luz do sol e achar ouvidos de gente. E por que não nos afoitamos?, afinal - lembra Fernando Pessoa -"tudo é ousado para quem nada se atreve".
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Ousar é atrever-se, abalançar-se. Ir mais além. Sair da inércia de quem vive apenas como um potencial e tornar-se, enfim, ato. Não transitar pelo pouco tempo que a vida nos ofereceu como uma potencialidade de existência que não surge e retarda existir. E se o passado, caro leitor(a), foi-te até aqui o que não conseguistes ser, que o futuro que ainda te resta seja o máximo que possas ser. Não esperes o pipocar do champanhe para desarquivar tua lista de intensões, pois, como dizia o poeta Carlos Drummond de Andrade, "é dentro de você que o Ano Novo/cochila e espera desde sempre". Se queres, contudo, continuar deixando pra lá teus potenciais ou pra mais tarde o que te é necessário ser, se buscas encontrar a escolha certa ou que não te achas preparado ainda, lembra-te que até então te sobra a vida e que "no declive do tempo os anos correm".

Felix sit annus novous

Joaquim Cesário de Mello

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