domingo, 11 de setembro de 2016

O COMBUSTÍVEL QUE NOS MOVE

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Recentemente fui presenteado por uma cliente com o livro FELICIDADE OU MORTE, escrito em quatro mãos por Clóvis de Barros Filho (advogado, escritor e professor universitário) e Leandro Karmal (historiador e professor universitário). De título um tanto forte e contundente o livro nos leva a passear pela história no tocante à ideia de felicidade, ideia esta inseparável e imanente da própria índole humana.
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O livro, realizado em forma de debate entre os autores, incia logo com a seguinte colocação: "a felicidade é muito mais conhecida pela sua ausência do que sua presença". Sim, de fato, afinal conhecemos a história humana em sua eterna busca pela felicidade, havendo exatamente busca porque nos falta essa tal da felicidade. Freud já afirmava que a felicidade é a realização de um desejo pré-histórico da infância. Sabe aquela imagem do coelho correndo atrás de uma cenoura amarrada em uma vara à sua frente que está presa ao seu corpo? Pois é, nós seres humanos muito parecemos com tal alegoria, afinal a nossa constante procura pela felicidade nos move e nos movimenta para frente. Você, por exemplo, caro(a) leitor(a) também busca ser feliz? Busca? Então responda: o que é felicidade? Sentimento de realização? Momento de alegria e satisfação? Contentamento e bem-estar? Estar de bem com a vida? A realização plena de todos seus sonhos? Poder ter materialmente o que quiser? Ser rico? Amar e ser amado? Ter um milhão de amigos? Seja lá o que você chame de felicidade tal conceito é sempre de caráter subjetivo. Para Dalai Lama o objetivo da vida humana é buscar a felicidade. Já para Saint-Exupéry felicidade é recompensa e não fim. Voltaire, por outro lado, entende que a única coisa que devíamos nos preocupar é em sermos felizes, enquanto diz o filósofo José Luis Nunes Martins que "ninguém busca a felicidade, o que procuramos é uma razão para sermos felizes... por entre todas as que nos fazem sofrer".
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Leandro Karnal, coautor do livro supracitado, escreve: "o conceito de felicidade, de tão difundido, esvaziou-se como signo. Virou coisa de propaganda de margarina". A sociedade de consumo mediocriza o conceito de felicidade. Vide, por exemplo, as prateleira das livrarias de shoppings: estão cheias de livro com fórmulas para se ser feliz. Vivemos tempos em que somos constantemente instados a ser felizes. Simplificamos a felicidade com compras, viagens e gastos. Busca-se, assim, atingir à felicidade como um preenchimento do vazio existencial. Deste modo o consumismo parece se apropriar de várias esferas outras da vida humana. Cada vez mais se comercializa sonhos, sentimentos e desejos. O denominado "argumento da felicidade" do capitalismo consiste na concepção que o acesso a uma maior quantidade de bens nos traz pari passu uma elevação da qualidade de vida. Observando mais de perto e na prática tal argumento concluímos ser ele uma enganação, uma farsa que escamoteia a escravidão do dinheiro. Não há satisfação duradoura e perene no consumo. O deleite e o aprazimento advindo do consumo é efêmero e fugaz. Comprou, curtiu, caducou, morreu. Trata-se de uma satisfação e de uma alegria fugidias.
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"Como nunca vivemos, esperamos viver" - já dizia Pascal explicando que jamais vivemos inteiramente no presente, pois vivemos um pouco para o passado e principalmente muito, muito, para o futuro. Isto até nos faz melhor entender o título de um outro livro, este escrito pelo filósofo francês André Comte-Sponville, cujo nome é A FELICIDADE, DESESPERADAMENTE. Nele Sponville cita Albert Camus: "os homens morrem, e não são felizes". Ah! se fôssemos felizes pela vida inteira, talvez aceitássemos melhor a finitude. Tem até quem diga "tenho tudo pra ser feliz", mas não se acha feliz. Ora, parece que mesmo o tudo não nos faz assim tão felizes. Ao homem, ao ser humano qualquer, sempre nos falta algo. A falta nos é, assim, interminável.
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Embora a noção de felicidade seja polissêmica, isto é. algo que tem muitos, diversos e variados significados, uma coisa nos parece ficar cada vez mais clara enquanto envelheço (ou seria melhor dizer amadureço?) que é mais do que ter tudo para ser feliz, é preciso saber ser feliz. Saber ser feliz nos remete obviamente ao tema sabedoria. Provavelmente a maior das sabedorias não é necessariamente "saber que nada se sabe", mas sim saber que a felicidade não existe como lugar ou estado perpétuo. O grande pensador da língua germânica Immanuel Kant já nos dizia isso, ou seja, que a felicidade é um ideal não da razão, porém da imaginação. Daí se entende a graça de Woody Allen que sentencia: "como eu seria feliz se fosse feliz". A felicidade é uma ilusão necessária à alma humana. Como acima dito, carecemos dela para seguirmos em frente.
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Seguimos em frente na procura da felicidade. Filosofa Schopenhauer "viver é sofrer". Não existe satisfação durável, lembra-nos o filósofo, pois para ele todo prazer é ponto de partida de novas aspirações sempre em luta contra os obstáculos de suas realizações. Por isso a esperança é uma crença emocional intrínseca e particular do ser humano. Comte-Sponville afirma que "esperar é desejar sem gozar". É com a esperança que aguardamos ser felizes no amanhã. A felicidade aspirada nos move, então, para o avanço. Buscamos ser felizes. Buscamos ser mais felizes. Buscamos a felicidade plena, como se procurássemos no dia-a-dia de uma vida inteira (re)encontrar a bem-aventurança do paraíso perdido.
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Pelo acima exposto não creio que a tal da felicidade seja um estado de espírito absolutamente livre de qualquer sofrimento. Esta seria uma procura por uma ideia idealizada, ou como diz o poeta Mayakovsky, "dizem que em algum lugar, parece que no Brasil, existe um homem feliz". Se pudesse responderia: "Mayakovsky, esse homem feliz que não existe na Rússia no Brasil também não se encontra". A felicidade que procuro contrapõem-se ao que disse Voltaire (citado acima), isto é, provavelmente é não se preocupando em ser feliz que posso ser feliz. Em outras palavras, renunciando à felicidade longínqua e irrestrita é que sou capaz de contentar-me em ser feliz nos meus limites. Ou como se diz por aí: menos é mais.


Joaquim Cesário de Mello

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