domingo, 13 de julho de 2014

o dia vira-lata


Hoje eu pretendia falar mais um pouco sobre artes plásticas, iria dizer algo sobre as “instalações” na arte contemporânea. “Instalações”? o que são “instalações”? Seria, grosso modo,   um tipo de obra de arte que compartilha com o ambiente,  o ambiente em que nós não somos apenas observador, mas parte do cenário. No teatro existe algo semelhante, explorado por Berthold Brecht, que se denominou de a queda da "quarta parede", somos na peça expectadores e atores. Mas deixarei de falar nisso para falar de algo supostamente banal. Do placar de jogo de futebol - logo eu? - e a ferida narcísica deixada no brasileiro, eterno orgulhoso, onde seus jogadores  são são heróis ou salvadores da pátria. De certo modo, não me distâncio da queda da quarta parede de Brecth: fazemos de um jogo o cenário incerto de nossas vidas.

Marx - o Groucho, comediante, e não o Karl Marx - disse que um país que necessitasse de heróis e salvadores da pátria não merecia ser salvo. É uma frase dura, mas que retifica e nos implica nas escolha, inclusive, de nossos governantes - que nunca serão salvadores da pátria.



Acompanhei outros momentos de tristeza nacional. A morte do presidente Tancredo Neves e de Ayrton Senna são algumas lembranças que vem a mente, duas comoções nacionais em que se via multidões caindo em lágrimas, depoimentos emocionados. "Nada, nada mesmo, se compara” dizia meu pai em tom solene assistindo à televisão “ nada se compara à derrota do brasil na copa de 50”. Estranhei o comentário, contudo, não havia como discordar, meu pai estava lá no Maracanã no dia sombrio em que o Rio de Janeiro já tamborilava a festa da vitória. O time do Brasil? "O melhor do mundo", bastava empatar. Fez o primeiro gol, terminou, contudo, perdendo do Uruguai por 2 x 1. O silêncio se estabeleceu como se tivesse morrido um parente próximo, o choro convulsivo se disseminara das arquibancadas e esparalha-se pelo país. 

Tive impressão que outro parente morreu na última terça-feira, uma morte dolorosa e, para muitos, vergonhosa, como se  tivesse morrido de uma morte ridícula.


Assisto pouco a jogos de futebol,  e, as vezes que vejo, são na Copa do Mundo. Irão surgir inúmeras teorias explicativas que justifiquem a derrota de 7x1.  Somos fadados a querer explicações para tudo que nos ocorre e haverá explicações, falarão do “estado psíquico” dos jogadores, da falta de empenho, de coordenação, de gerência, de política esportiva. Chegarão as teorias   de conspiração que venha a nos consolar. Haverá de surgir  os profetas do passado, “um pai de santo já havia dito",   metáforas semelhantes a de Nostradamus haverá de surgir.  Haverá até nome de síndrome para esse acontecimento, mas esquecerão  que em tudo que nos ocorre existe algo que não temos o menor controle: a contingência. Mesmo que fóssemos os melhores, os mais hábeis, os mais aptos - o que não me parece o caso -  nem sempre acontecerá o previsível, nem sempre teremos 100% de êxito. No caso de terça-feira, somou-se a essa contingência à falta de aptidão - em parte perdemos porque fomos piores, mas se pelo contrário fóssemos aquele time do mundo de 1950, ainda sim, um átimo de infortúnios leva ao inesperado.     Dominamos pouco o que nos ocorre, não controlamos as inúmeras variáveis que estão a nossa frente. Podemos, a depender da aptidão, até prever um tendência, mas jamais um caminho linear.  Nessa terça,  eis o acaso dando mãos ao infortúnio que - que tem lá seu parentesco com a incompetência e nos presenteia com o inexplicável. Esqueçamos. Haverá na história de cada um, cinco minutos trágicos, haverá o dia em que parafraseando Nelson Rodrigues, seremos vira-latas. Vira-lata que fracassam frente aos pastores alemães.

Voltarei a falar… das instalações em outro momento - afinal, não sei nada de futebol.  

Marcos Creder

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