domingo, 14 de janeiro de 2018

Sou um leitor de biografias. Na verdade, estou sendo. Nno passado achava chato esmiuçar a vida de outras pessoas, com o tempo fui me interessando - não sei bem o que me fez interessar,  nunca procurei fórmulas de sucesso ou de insucesso, manuais de genialidade ou de bestialidade. Imagino que o tirano ou o bondoso podem ser uma pessoa como eu ou você.  Acredito cada vez menos nessas fórmulas dos iluminados e, recentemente, ao ler a biografia de Leonardo Da Vinci, concluí que realmente não há fórmulas, algoritmos, receitas de bolos para aqueles que se destacaram. Leonardo nada teve de luminoso na sua vida.


Os biógrafos em geral torcem para o seu biografado, hipertrofiam sua genialidade ou sua tirania e romanceiam as suas vidas. Toda vida dá um bom ou mau romance, a depender de quem escreve. No livro “Leonardo Da Vinci” , do jornalista Walter Isaacson  foi  diferente. Confesso que saí um pouco decepcionado com o renascentista: moroso, neurótico, lento, um perfeccionista desnecessário - ou seria por que o autor deu relevância aos aspectos a mim menos importantes do biografado?  De fato, fui atrás do artista Leonardo e  Isaacson trouxe-me  um Leonardo  inventor. Diga-se de passagem, um inventor que colecionou fracassos. Leonardo  foi aquele que quase inventou o avião, quase inventou o helicóptero, quase descobriu elementos importantes da fisiologia e da anatomia humana, quase foi um bom físico. Quase. Achei enfadonho saber dos detalhes dos seus rascunhos e dos seus esboços, que jamais foram publicados. - as gravuras, os desenhos, contudo, são maravilhosos, pois mostrou-me o verdadeiro Leonardo, o Leonardo  artista que pensa com imagens.

Mas até mesmo na expressão artística,  Isaacson vai em busca de uma espécie de ciência da arte. Descreve métodos, técnicas, misturas de cores, efeitos ópticos de perspectivas que são interessantes, mas que mesmo assim não são suficientes para fazer de Leonardo um gênio da arte. Faltou explanar sobre a estética de sua pintura. Suponho que um autor desses (lembro que Isaacson é jornalista e biógrafo profissional de celebridades como Steve Jobs ou Einstein) ,  julgaria perda de tempo ao analisar as obras de Picasso, MIró, Paul Klee  ou  Mondrian -faltam-lhes, diria, a “ciência” do florentino. É plausível tentar fazer da ciência uma arte, mas da arte uma ciência, é bem mais complicado. A arte foge aos padrões ou as regras do método científico. A arte tem como uma de suas funções, desamarrar as invencionices. E Leonardo foi muito mais pintor que inventor e se há método na sua pintura, o método não é científico, o método chama-se: Leonardo Da Vinci.  

Mas o livro tem a vantagem de aproximar do homem de sua época. Achei curioso uma passagem do livro quando Leonardo, enciumado  do sucesso de jovem Michelangelo, sugere que a sua famosa escultura de Davi tenha as partes íntimas cobertas por julgar obscenas. Leonardo era menos religioso e moralista  que Michelângelo. Pintou nus, foi ousado quando bem quis, no entanto, em razão de um desafeto apoiou o moralismo. Isso me fez lembrar a ridícula discussão sobre a arte no Brasil. Enfim,  Isaacson pode trazer, ao contrário de seus biógrafos anteriores, um Leonardo demasiadamente humano. Acertou.


Guilherme Leão

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