Não existe relação terapêutica
se não houver uma aliança terapêutica (AT) entre o cliente/paciente e o
psicoterapeuta. É necessário que ambos estejam engajados na tarefa
psicoterápica. Afinal, não basta alguém ir para um profissional
(psicoterapeuta) e este aceitar recebê-lo. É preciso, pois criar um VÍNCULO de
trabalho entre ambos. A AT é, portanto, a capacidade de estabelecer uma relação
de trabalho entre a dupla, e é a base do processo psicoterápico.
A AT é considerada como a base do tratamento porque, a
partir da postura de acolhimento e escuta atenta do terapeuta, o mesmo oferece
um clima de confiança e respeito. Sentir-se compreendido é condição essencial
para que o paciente continue seu tratamento.
Se ficarmos no resumo acima, iremos acreditar que as coisas
parecem fáceis. Basta ser acolhedor e respeitoso, bem como o cliente se sentir
compreendido, que tudo vai correr à mil maravilhas. Cuidado, nem sempre é
assim.
Tudo seria simples e descomplicado se o ser humano não fosse
naturalmente um ser de paradoxos e conflitos.
Lembrem-se, a condição sine
qua non para existir de fato uma psicoterapia é, por parte do cliente/paciente,
haver uma percepção subjetiva de estado de sofrimento. Não se procura terapia
porque se está feliz, bem resolvido, tranquilo, e bem com a vida e as pessoas.
De jeito algum!!!!! Procura-se uma ajuda psicoterápica porque existe na pessoa
aflição, desgosto, preocupação, ansiedade, tristeza, angústia, enfim, algum
sofrimento de ordem subjetiva.
Todavia, a mente humana é escapista, ou seja, funciona no
que convencionamos chamar PRINCÍPIO DO PRAZER-DESPRAZER, isto é, busca prazer e
evitar dor. É exatamente essa qualidade psíquica que faz com que a psique humana
manifeste, em algum momento, do processo psicoterápico, RESISTÊNCIA. E por que
isso?
Lembrem-se que quando uma psicoterapia tem caráter
exploratório, isto é, voltada ao INSIGHT, ela vai mexer com coisas que vão incomodar
a mente, como feridas antigas na alma, por exemplo. Nem sempre queremos ver
certas coisas em nós, pois isso dói. Então, o psiquismo tenderá a evitar ou
fugir do que vai lhe gerar esforço, incômodo, desconforto.
Pelo acima exposto, é interessante pensarmos o tema pelo
ângulo proposto por RICHARD STERBA em ao final da década de 30. Em um pequeno
artigo intitulado QUAL O DESTINO DO EGO EM ANÁLISE? (análise aqui deve ser
pensado, inclusive, em termo de auto-observação e auto investigação, isto é, um
EU que se reflete e se pensa0, o autor mesmo responder: DIVIDIR-SE EM DOIS.
Para tal ele cunhou o conceito de CISAO TERAPEUTICA DE EGO. Como assim?,
vejamos:
Observem o seguinte trecho deste poema de FERNANDO PESSOA:
Brincava a criança
Com um carro de
bois.
Sentiu-se
brincando
E disse, eu sou
dois!
Há um a brincar
E há outro a
saber,
Um vê-me a brincar
E outro vê-me a
ver.
Pois é. Quando uma pessoa procura
uma psicoterapia ele vem relatando suas vivências e experiências (STERBA
denominou de EFO ANALÍTICO). Por outro lado, o terapeuta tem uma postura
investigativa, questionante, ou seja, de analisar com o paciente suas próprias
experiências, vivências, sentimentos, pensamentos e comportamentos. Isso vai
levar o paciente a melhor se auto-observar, ou seja, ele passa a ser, além de
um EGO VIVENCIAL, a ser também um EGO ANALÍTICO, pois ele começa a se analisar
por detrás de suas experiências, sensações, pensamentos, comportamentos e
sentimentos. Daí a expressão CISÃO TERAPEUTICA DE EGO: um EGO inicialmente
somente VIVENCIAL, sendo agora dois: EGO VIVENCIAL e EGO ANALÍTICO.
Lembrem—se a auto-observação (analisar
a si mesmo) coloca o
EGO pensante (consciente) frente aos mecanismo psíquicos
(geralmente inconsciente a esse mesmo EGO) de defesa e resistência. É avançando
sobre essas defesas e resistências que o EGO do cliente/paciente melhora, cresce,
amadurece. Trata-se de um paradoxo: para
se deixar de sofrer, há de se sofrer um pouco mais (avançar sobre o que está
por debaixo de muitas coisas e que a mente não quer ver, pois vai mexer em
coisas que lhe farão se incomodar).
É como se o cliente/paciente
colocasse o terapeuta (sua função de analisar) dentro de si. E é isso mesmo que
acontece, graças a um fenômeno psíquico conhecido como IDENTIFICAÇÃO.
Observem o resto do poema
acima:
Estou por trás de
mim
Mas se volto a
cabeça
Não era o que eu
queria
A volta só é
essa...
O outro menino
Não tem pés nem
mãos
Nem é pequenino
Não tem mãe ou
irmãos.
E havia comigo
Por trás de onde
eu estou,
Mas se volto a
cabeça
Já não sei o que
sou.
E o tal que eu cá
tenho
E sente comigo,
Nem pai, nem
padrinho,
Nem corpo ou
amigo.
Tem alma cá dentro
Está a ver-me sem
ver,
E o carro de bois
Começa a parecer.
Olhem esse vídeo sob nova perspectiva:
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