Vivemos
a era do “politicamente correto”. Em nome de uma não discriminação e da
preservação da dignidade humana sem a existência de preconceitos,
principalmente racistas e sexistas, camufla-se uma forma nem tanto sutil de dominação,
censura e repressão. Em nome do “politicamente correto”, portanto, restringe-se
a liberdade de expressão através de um patrulhamento ideológico conservador
quase ao estilo macarthista.
Essa
tal coisa do “politicamente correto” começo em meados dos anos 70/80 do século
XX lá pelas bandas dos EUA. Inicialmente aplicou-se ao universo linguístico e
rapidamente estendeu-se a outras práticas sociais. A partir daí não se chama um
negro de negro, mas de afrodescendente, bem como se deve evitar o verbo judiar,
pois ele está negativamente associado ao judeu. A linguagem tá ficando tão
puritana que daqui a pouco vamos ter poucas palavras do velho dicionário para
se usar, ou então se criar um novo dicionário aos moldes do Novilíngua. Para
quem porventura não saiba o que danado é Novilíngua remeto-o ao livro 1984 de
George Orwell, livro este que cunhou também o termo “Big Brother” que os mais
ingênuos apenas conhecem como um programa de televisão. O Novilíngua é uma nova
fala ficticiamente criada por um governo altamente autoritário cujo objetivo
não era criar novas palavras, mas sim remover o sentido de determinadas
palavras com o intuito de restringir o pensamento crítico. Por exemplo, no
Novilíngua não existia o vocábulo liberdade para que não se pensasse em liberdade.
Pois é, daqui a pouco teremos já já o nosso Novilíngua.
Pois
é, no excesso do “politicamente correto” chegamos ao ponto de se impor mudanças
nas narrativas históricas e até mesmo em obras artísticas e literárias, como
foi o caso recente do Conselho Nacional de Educação (CNE) frente à obra de
Monteiro Lobato. Em seu livro Caçadas de Pedrinho há frases como “Não vai escapar ninguém – nem Tia Anastácia
que tem a carne preta”. É meu nego, a coisa tá russa e tá ficando cada vez
mais preta. Vixe! esqueci que num posso falar assim; vão deletar este meu texto
do blog.
Que
intenções habitam as aparentes boas intenções do modismo do “politicamente
correto”? Há um velho ditado popular que
diz de boas intenções o inferno está
cheio. Segundo o filósofo e escritor Luiz Felipe Pondé, em relação ao
Brasil, o “politicamente correto” serve para mascarar a incompetência do Estado
brasileiro, como, por exemplo, na questão das cotas raciais nas universidades,
visto que o Estado arrecada muito dinheiro e ao invés de investir em uma escola
descente o governo fica preocupado com cota e continua fazendo uma escola
pública que é uma verdadeira porcaria. De que adiante, pois, abrir vagas a
fórceps nas universidades para grupos ou pessoas desfavorecidas socialmente se
elas lá chegam quase como “analfabetas funcionais”, no sentido de serem adultos
que infantil e adolescentemente foram educadas de maneira precária? Ainda
segundo o próprio Pondé, em seu recente livro Guia Politicamente Incorreto da
Filosofia, “o mundo virou um churrasco na
laje”.
Sim,
por detrás do discurso do “politicamente correto” muitas vezes se esconde uma
beatice moral hipócrita e aleivosa que busca aviltar a inteligência minimamente
crítica e contestatória. Ressalve-se, de passagem, que não estou a me opor a
necessidade de ser abrir entradas a grupos sociais no espaço público antes a
eles negado, ou de se respeitar as diferenças e as minorias. Claro que não.
Todavia estamos correndo o sério risco de não mais poder-se escrever um livro,
uma peça de teatro ou fazer um filme onde o vilão ou o mau caráter da história
seja negro, gay, pobre ou índio. Aliás, desculpem-me, estou esquecendo das
mulheres, dos anões, dos gordos, dos cadeirantes, das empregadas domésticas,
dos corcundas, dos velhos, dos vesgos, dos que têm pés chatos, dos judeus, dos
tronchos, dos feios... Que tal acabarmos que os vilões e só termos mocinhos na
vida? Eh, se fosse hoje Shakespeare seria processado por
racismo por haver escrito O Mercador de Veneza, ou Homero por sexismo com
Odisseia.
Como disse certa vez o
apresentador da MTV Paulo Bonfá, “hoje em
dia o saci seria um afrodescendente portador de necessidades especiais”.
Pois, estamos cada vez mais nos policiando uns aos outros como quem vive sob o
regime de um Estado totalitário e fascista. Estamos nos submergindo pelas águas
da onda de vigília do “politicamente correto”. A liberdade de expressão vai se
resumindo em uma liberdade socialmente vigiada e permitida desde que nos
ditames do que se deve pensar, dizer e agir. E, assim, no intuito santimônio de
dignificar o outro não falemos mais de putas, mas sim de “profissionais do
sexo”; de bichas, mas sim de “homoeróticos”; de velhice, mas sim de “melhor
idade”... É realmente mais fácil mudar as palavras do que mudar o mundo.
E do que pouco ou quase nada sei
(não sou lá tão socrática assim), sei que a política do “politicamente correto”
criou um nova minoria: a minoria dos politicamente incorretos. Ser tachado de
politicamente incorreto faz alguém parecer ser diferente e devemos correr dele(s)
como o diabo corre da cruz. Cruz credo. Chegamos ao extremo (talvez o extremo
seja ainda mais extremo mais adiante) de não podermos dar uma mísera palmadinha
num filho, pois isto é pecado e crime, e talvez por isto tenha visto certa vez
na rua uma mulher jovem dando uma prensa no seu filho birrento e uma outra
mulher mais velha, parecendo ser a mãe da mãe, dizendo: bate nele não, estamos
na rua. Pois é...
Bem, convoco aqui os
coordenadores do blog ao debate, bem como aos colaboradores e mais precisamente
o Guilherme Saraiva. Porém, antes de mais nada talvez seja
melhor utilizar o “politiques correto” e eufemizar o título tão incorretamente
acima dado. Retirem o mesmo e em seu lugar leiam: PUXA VIDA, GENTE: QUE TÉDIO!
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