Rebeca
diz a si mesma, Vencerei, serei forte. Lera essas palavras no facebook do perfil “motiva a ação” compartilhado por um amigo dependente químico. Ao sair da sessão de psicoterapia, desligou o celular. Na rua sentiu-se
insegura, temia não saber chegar a canto algum, mas, por outro lado, dirigia com mais prudência, e ainda, observava a rua e
seu entorno com minúcia e nitidez, uma árvore havia crescido, uma fachada de
casa modificara, um novo restaurante se anunciava. Tudo parecia-lhe novo,
como se aquela paisagem jamais tivesse existido, ou se existisse, envolvera-se de estranhas percepções enoveladas de recordações anacrônicas e desconhecidas - algo como uma
lembrança remota. Esse desfile de imagens despertou-lhe um sem
número de sentimentos saudosistas; lembrara, das festas de sua
adolescência, das conversas à beira-mar, dos almoços de domingo nos
clubes – clube? Quando foi a ultima vez que estive num clube?, pensou. Tudo parecia-lhe distante e quimérico, como se tivesse revivendo “vidas passadas”, recordações do tempo da ingenuidade. Rebeca entristecia e por um impulso
procurou seu rosto no retrovisor do carro e verificou, não envelhecera tanto
assim, era jovem, tinha trinta e poucos. Não faz tanto tempo. Seu rosto, do mesmo modo, se mantinha coerente. Sou ainda atraente, disse em voz alta ao espelho que
concordou em silêncio. era preciso prevenir , contudo. Rebeca postava as fotos nas redes
sociais que parecia ter menos de vinte anos. Melhor assim, afirmava. O mundo havia se disfarçado. Mais feliz, mais viçoso.
Ao
passar por um cruzamento, já perto de casa, Rebeca vê uma senhora atravessar a rua e foi tomada pelo mesmo estranhamento: conhecia aquela mulher. Sim! Conhecera nos tempos de colégio, inclusive, era amiga íntima. Rebeca não lembrava o seu nome, esforçou-se para recordar, frustrava-se, aborrecia-se. Teve vontade de abrir a janela do carro
e chamar-lhe aos gritos. Rebeca para o carro e tentar alcançar a amiga a pé.
Aperta o
passo. No caminho, ocorreram-lhe rápidas lembranças. Era uma amiga maravilhosa, de boa índole,
carinhosa e tão estudiosa quanto ela. Passaria facilmente no vestibular. O
casamento viria, por prudência, no início da vida profissional. Tinha beleza,
desejo e inteligência. Seria feliz? Ao se perguntar, Rebeca pondera, Se eu a procurasse no facebook talvez tivesse uma “pista”, mas não sei seu nome, lamenta-se. Se, reflete, tivesse rede social teria visto e recordado seu nome. Rebeca, obediente a
sua abstinência, recusou-se a checar no celular. Estava há poucos metros, apressava-se, e temendo que a mulher entrasse
em um prédio, não resistiu e gritou, Senhora, por favor! A mulher olha para trás, contrai as pálpebras. Perdão, continuou Rebeca, mas tenho certeza que a conheço, suponho que estudamos juntas, lembra de mim?
A mulher sorri e diz, como poderia esquecer? Abraçam-se. Me perdoe,
disse Rebeca, Esqueci completamente seu nome, faz tempo que não a vejo, sequer
nos encontramos na internet. A mulher sorri
mais uma vez, Não estou tão irreconhecível assim, amiga. Continuamos parecidas. Vamos conversar, relembrar? quanto tempo você tem? Rebeca ergue a cabeça: mas eu moro aqui também! A mulher passa-lhe a mão na cabeça e diz, tá vendo só, estávamos aqui o tempo todo e não
nos vimos. A propósito meu nome você sabe, é Rebeca.Marcos Creder
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