Nosologia vem do grego “nósos” (doença) + “logia” (estudo). Ao pé-da-letra, trata-se do conhecimento e estudo das enfermidades em geral, suas classificações, etiologias, patogenias e sintomatologias. A nosologia, pois, faz parte das chamadas ciências da saúde. E saúde, lembremos mais uma vez, não se promove apenas pelos aspectos biológicos, visto que somos seres bio-psico-sociais isto é, a promoção da saúde é interacional, pois envolve vários ramos do conhecimento humano e é fomentada por diversos aspectos pessoais, sociais, políticos, econômicos e culturais. Em outras palavras, saúde também faz parte das ditas Ciências Humanas.
O Ato Médico, do jeito que está disposto, abre espaço
para um perigoso retrocesso, ao privar o cidadão de outras abordagens
terapêuticas que não biologizantes, ou de submetê-las ao julgo médico tão
somente. Evidente e indiscutível a importância e até indispensabilidade do
médico na área de saúde, mas isto não significa a desimportância e a subordinação
dos outros profissionais da área de saúde. Será que só o médico, e sempre ele,
é capaz de avaliar um paciente e definir como se deve realizar o tratamento, e
isto para qualquer problema? Toda adversidade, dificuldade ou problema que gere
mal estar é questão exclusivamente médica, ou que tem que passar primariamente
pelo olhar médico? Uma crise conjugal, por exemplo, que esteja gerando um
elevado estado de tensão, preocupação, ansiedade e que esteja provocando
disfuncionalidade em várias áreas da vida da pessoa em crise, é um problema especificamente
médico ou que tem que obrigar a pessoa a procurar primeiramente um médico ao
invés de um outro profissional capacitado pra tal situação? Alguém que trás
consigo traumas infantis só pode ser encaminhado a uma psicoterapia se o médico
assim achar e determinar? Da mesma forma que um psicólogo não está instrumentalizado nem qualificado para diagnosticar muitas das doenças de origem somática, um médico igualmente não é capacitado para diagnosticar muitos dos problemas de natureza psicológica.
O radicalismo contido na Lei do Ato Médico, portanto, tira a autonomia de enfermeiros,
psicólogos, farmacêuticos, fisioterapeutas, terapeutas ocupacionais, nutricionistas, biomédicos, fonoaudiólogos, entre outros ramos profissionais pertinentes e afins.
Óbvio que a categoria
profissional dos médicos tem que aprimorar e melhor regulamentar o conjunto de
suas atividades, competências, funções e ofícios, assim como as demais
categorias outras. Todavia tornar privativo de uma classe profissional única
todos os procedimentos de diagnósticos e indicações de tratamentos não leva em
conta a complexidade do ser humano. Tal verticalização hierárquica parece
apontar para o risco de se criar uma espécie de “reserva de mercado”, ao
restringir outros profissionais de saúde. Prejudicando assim a autonomia das
diversas profissões, possibilita-se o perigoso surgimento de uma verdadeira
autocracia.
Que se fique claro que nosso posicionamento não é
contrário a regulamentação de qualquer classe profissional, mas sim que as
competências específicas de uma categoria não prejudiquem as demais. Pois,
desse modo, daqui a pouco se vai dizer que um psicólogo, por exemplo, não pode
ter competência de identificar sintomas depressivos ou de diagnosticar transtornos
psíquicos em um paciente seu. É necessário, portanto, analisar e melhor reformular o texto de lei final, para que se possa tanto
valorizar a profissão médica quanto a multiprofissionalidade em questão. Ou,
como dizia Kurt Lewin, “autocracia é
imposta ao indivíduo. A democracia, ele deve aprender”.
Ainda é tempo de continuarmos
aprendendo...
Joaquim Cesário de Mello
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