domingo, 1 de abril de 2018

O "Idiot de Savant" da atualidade



Provavelmente a maioria dos leitores desconhecem a expressão utilizada no passado “Idiot Savant”. A palavra “idiot” por si só já é sugestiva: refere-se ao “idiota” palavra que no passado categorizava um tipo (grave) de retardo mental e que hoje tem uso pejorativo. Já a expressão “savant” na língua francesa  significa “sábio”. Como assim, um idiota sábio? Parece contraditório relacionar essas duas palavras uma vez que se for sábio não se pode ser idiota. Não é bem assim, leitor. Há sim alguma sapiência, mesmo que estéril, nos deficitários. Quando os franceses criaram essa expressão quiseram se referir à excepcional sabedoria que há nos transtornos do espectro do autismo, especialmente no transtorno de Asperger. Há neles, eventualmente, capacidades intelectivas extraordinárias, geralmente envolvendo habilidades específicas, como  a capacidade de realizar cálculos numéricos complexos, facilidade no aprendizado de línguas estrangeiras ou memorização de textos. Contudo, faltam-lhes a capacidade afetiva e associativa suficientes para julgá-los inteligentes no sentido mais abrangente dessa expressão. Esse tipo de habilidade nos cativa pela peculiaridade e pelo descompasso que há entre o saber e a maturidade intelectual do sujeito.


Como funciona a mente de um Idiot Savant? Arrisco-me a comparar - e quando comparamos sempre incorremos em erros - essa modalidade de saber com uma entidade tecnológica virtual: o Google (ou os buscadores da internet). A astronômica capacidade de armazenamento de dados dessa ferramenta, que tudo nos informa, mas não sabe o que diz, é extraordinária. Se ponho uma palavra no Google, sua rede de algoritmos pode redigir meus questionamentos, antes mesmo da conclusão da frase. Maravilhoso!.  Falta-lhe, contudo, habilidades afetivas e, principalmente, os elementos afetivos do raciocínio. O Google sem mediadores é deficitário e, especialmente, criador de equívocos. Equívocos que dominam a internet. Esses equívocos vem formando uma nova forma de savantismo. O sábio tecnológico, o sábio virtual, cuja a expressão afetiva geralmente é dominada pelo ódio e pelo ressentimento. Esse novo tipo de savantismo, raso de consistência, radical em conceitos universais, extremistas em defender seus preceitos, tem severas dificuldades de se relacionar com o outro -desses sábios surgem os Haters.  Se, por outro lado, procuramos uma informação, há sempre um expert que nos ensinará os pormenores de um determinado tema. Se nos utilizarmos dos dados, por exemplo, de como eu posso guiar um avião, um navio, um submarino nuclear, aprendo, mas (felizmente) não executo - eis aí o nosso savant tecnológico. São filósofos, antropólogos, cientistas sociais, astrônomos, críticos de arte, escritores, cientista, articulistas, jornalistas, músicos.

Observando assim tanta fartura de conhecimento no mundo atual, utilizo-me de uma frase de Nelson Rodrigues ao assistir uma adaptação de uma de suas peças em São Paulo: Sejamos burros.


Guilherme Leão  

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