Costumo discutir temas que foram noticiados na mídia quando começam a cair no esquecimento. As informações da mídia - embora não todas
- e das redes sociais tem um jeito de ser "emocionalmente
instável": vivem das bizarrices, das fortes emoções, das palavras
impensadas e costumam reagir por impulso. Os temas
equivocados ou boatos são noticiados com enorme velocidade, não foram
"digeridos" adequadamente e que produziram verdadeiros levantes
histéricos. Há, por exemplo, um conhecido acontecimento que ocorreu em São Paulo que bem representa o fenômeno histérico midiático, evento que que muito ensinou, ou deveria ter ensinado, ao
jornalismo brasileiro. Trata-se do episódio da" Escola de Base", um colégio
infantil que fechou suas portas, após ter se ouvido a denúncia de um dos pais de que estava ocorrendo
abuso entre professores, funcionários e alunos. Seus diretores, escorraçados, foram acusados de perversos. A testemunha? Uma criança de 6 anos de idade.
Se se fizesse mais comentários no calor de fortes emoções, provavelmente se acrescentariam mais erros, além dos já cometidos. Na
verdade, toda a turba do acontecimento foi construída por uma fantasia infantil
- fantasia no sentido analítico da palavra, sem a consciência de que se
fantasiara.
Em muitas ocasiões a imprensa ou as redes
sociais noticiam um fato ocorrido inquestionável e tentam, por suas próprias influências, criar uma espécie de solução mágica para as condições contingentes, ou dar explicações simplórias a eventos que carecem de discussões profundas. Um exemplo disso é o caso do recente desastre aéreo que ocorreu na Europa - provocado pelo copiloto. Pude
assistir às soluções mirabolantes: testes psicotécnicos, de
personalidade, avaliação psiquiátrica, como se tudo isso fosse, de fato, evitar
tais tragédias. Uma pergunta: se foi uma depressão que levou ao ato, podemos afastar permanentemente
um profissional de suas atividades por conta desse estado e de riscos que estão envolvidos? Podemos prevenir tragédias com avaliação psicológica ou psiquiátrica?
Se a depressão levou ao evento, corre-se o risco de por todo deprimido sob suspeição, culpabilizando-o por fatos que venham, porventura, a ocorrer
que estão fora do nosso controle. Na verdade, poucas coisas da vida estão sob
nosso controle e uma das mais distantes do nosso domínio são os atos suicidas.
Sabe-se que, apesar de todo o aparato científico, médico/psicológico
desenvolvidos no século XX e XXI, as estatísticas do suicídio não vem
diminuindo, vem aumentando e, mesmo nos países onde a assistência à saúde é mais adequada, ainda assim não se evita, sequer diminuiu, esse extremo do comportamento autodestruição – pelo contrário, os países
desenvolvidos tem índices maiores que os subdesenvolvidos. Uma pergunta
que se faz, então: o suicídio está relacionado ou não a transtorno psíquico? A resposta
é ambígua e imprecisa, haja vista a complexidade do tema.
Emile Durkheim
defendia a ideia do suicídio como fenômeno de natureza plenamente social e que o fator doença psíquica tinha pouca influência. Muitos dos seus estudos delimitaram comunidades onde ocorriam esse ato com mais ou menos
frequentemente. Os parâmetros que nos acostumamos a ver como causadores de suicídio,
como situações de guerra, para Durkheim representavam, paradoxalmente, menos
risco de suicídio do que período de paz. Controvérsias à parte, para esse autor
o transtorno mental pode ser diagnosticado em suicidas, mas há comunidades em
que muitas pessoas tem o mesmo diagnóstico e os índices de suicídio são baixos. As explicações encontram-se nos elementos culturais, inclusive religiosos, de cada comunidade em relação ao suicídio. A depressão para uma sociedade que tem o suicídio como parâmetro existencial tende
a ter, desse modo, índices mais elevados no Japão. No entanto, no Japão, nos países
do oriente e oriente médio há uma forma de suicídio que está longe de ser
diagnosticado como ato de doente - Durkheim chamou de suicídio altruísta - mas como causa social. Os homens e mulheres
bombas são exemplos disso. Mesmo que se afirme que 15 por cento dos deprimidos se
matam no mundo ocidental, deve-se ter em mente que a depressão pro si só, não se
justifica em níveis macro-populacionais. Tem elementos que levam ao suicídio que estão mais além das
explicações psiquiátricas e psicológicas.
Apesar do suicídio ser um ato próprio do humano – há quem
acredite que os roedores em grandes populações comentem ato semelhante – não é exclusivo de transtornos mentais. Soluções inspiradas em interpretações psicopatológicas não são suficientes nem previnem de
forma global o ato suicida– podem, contudo, serem úteis quando se trata de casos isolados.
Marcos Creder
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