O orgulho e a confiança
exagerados têm no grego o termo húbris, que significa “tudo que passa da medida”.
Tal palavra era usada na Grécia antiga para falar de quando o ser humano
insolentemente desafiava os deuses, desconsideração essa que geralmente
resultava em castigo. A Lei de Nêmesis (deusa da vingança) assim se escrevia: “tudo que se
eleva acima da sua condição, tanto no bem quanto no mal, expõe-se a represálias
dos deuses”.
Orgulho e confiança são
necessários ao ser humano, porém o descomedimento das mesmas, isto é, o excesso
e o exagero levam à prepotência e à arrogância. É quando a alma se embriaga de
si mesma e com isto não enxerga bem a realidade e suas consequências. Não
respeita os limites até dela própria. É uma falsa superioridade da alma em cuja
autoafirmação desmedida encontra eco lá nas profundezas do psiquismo humano: em
nossa ilusória onipotência ou desejo pela mesma.
Embora sejamos o que sejamos na realidade,
do ponto de vista subjetivo projetamos sobre nós mesmos uma imagem muitas vezes
idealizada. É difícil reconhecer nossa insignificância frente à vida e ao
mundo. Fere-nos a alma em nosso narcisismo inato. Ocultamos de nós próprios
nossa pequenez. Disfarçamo-nos de maiores do que somos. Uns até se mascaram
ainda mais de superioridade e excessiva autoconfiança. É, nosso psiquismo tem
lá suas manhas e nos prega vez em quando algumas enganadoras peças.
Devemos nos regozijar e usufruir do nosso
sucesso e conquistas na vida, sermos a nós mesmos até gratos por isso. Contudo
devemos evitar que tal gratidão azede e se transforme em orgulho, soberba. Não
sou daqueles que acham o orgulho um sentimento negativo, pois credito ser
salutar se ter orgulho de si e de suas realizações. Um orgulho autêntico e
pertinente tem correlação com a autoestima do sujeito. Uma boa autoestima, por
sua vez, gera uma melhor autoconfiança. A questão sob comento é, e ainda é, o
excesso. Excesso de autoconfiança frequentemente gera imprudência, e uma pessoa
imprudente geralmente é precipitada e desacautelada.
Pessoas assim embriagadas acham
que podem fazer tudo. Devido a um ego desmedido têm a sensação de possuírem dons
especiais e quase divinos. Ruminam ideações de caráter megalomaníacos que,
embora possam ser ideias e desejos aplicáveis a longo prazo, acreditam que
farão ou realizarão quase em um estalar de dedos, e sem nenhum ou pouco esforço
e sacrifício. Não sabem combinar a ousadia, com adiamentos e renúncias. Apesar de
não existir diagnosticamente uma síndrome de hubris, percebe-se reuniões de
sinais que sintomatologicamente dariam para classificar um transtorno ou algo
um tanto quê patológico.
Coitada da alma humana que, na pequenez míope de sua ilusória superioridade, arrota para dentro imodestas prepotências e arrogâncias tão grandiosas como se fosse ela própria o inteiro universo. Não sabe ela, ou evita saber, que "cada um de nós é um grão de pó que o vento da vida levanta, e depois deixa cair" (Fernando Pessoa). Porém é como ainda diz o poeta quando diz que "o homem fatal, afinal, existe nos sonhos próprios de todos os homens vulgares". Talvez seja este o destino da alma humana, como bem observou Freud, vivermos como se fôssemos de ferro enquanto somos feitos de carne. Apenas que, aqui e acolá, uns querem ser de mais ferros do que os outros, e esquecem que até os ferros enferrujam. Esta é a lição de Ícaro que ao querer se aproximar do sol despencou.
Quando a autoconfiança e a
autoestima são demasiadas e transbordantes as mesmas podem estar funcionando
como uma máscara protetora de uma insegurança tão proporcional quanto o tamanho
da aparente autossuficiência. Já em outras pode ser sinal de estágios de
euforia e elação, ou ainda manifestação de uma personalidade organizadamente
narcisista.
Todos, de alguma forma,
damo-nos uma importância maior do que realmente temos. Há indivíduos,
entretanto, que se dão um sentimento grandioso de importância. Superestimam suas
próprias capacidades e exageram suas realizações. Em seu imaginário há fantasias
e anseios de sucesso ilimitado e poder. Seu eu grandioso é reflexo de uma
autoimagem majestosa e imponente. Porém, sua autoestima é frágil, correndo-se o
risco de facilmente se magoar ou de ter raiva quando é criticado ou quando
sofre derrotas.
Coitada da alma humana que, na pequenez míope de sua ilusória superioridade, arrota para dentro imodestas prepotências e arrogâncias tão grandiosas como se fosse ela própria o inteiro universo. Não sabe ela, ou evita saber, que "cada um de nós é um grão de pó que o vento da vida levanta, e depois deixa cair" (Fernando Pessoa). Porém é como ainda diz o poeta quando diz que "o homem fatal, afinal, existe nos sonhos próprios de todos os homens vulgares". Talvez seja este o destino da alma humana, como bem observou Freud, vivermos como se fôssemos de ferro enquanto somos feitos de carne. Apenas que, aqui e acolá, uns querem ser de mais ferros do que os outros, e esquecem que até os ferros enferrujam. Esta é a lição de Ícaro que ao querer se aproximar do sol despencou.
Joaquim Cesário de Mello
Olhe, eu até queria discordar de algo pra provocar discussões, mas o modo tão redondo com que tu levantou esses aspectos, do jeito que vejo e quero ver o bicho-homem, não me deixa brechas pra atiçar outras visões nesse instante. Inclusive agradeço pelo artigo.
ResponderExcluirNo entanto se houver mais viagens adentro dessa ala perigosa da alma humana, gostaria de ver!