O cinema de muito é utilizado nos cursos de Psicologia, subsidiando e embasando assuntos, exemplos e temas da área do conhecimento sobre os fenômenos psíquicos e comportamentais humanos. O cinema, decididamente, facilita a compreensão teórica dentro de uma perspectiva vivaz de movimento e cena. Contribui, sobremaneira, com o debate, a análise e a discussão de alguns processos psicodinâmicos estudados pela ciência.
A relação entre cinema e Psicologia vem desde o
surgimento da própria arte cinematográfica, visto que em sua estreia, em Paris,
em 1895, quando os irmãos Lumiére exibiram ao público as imagens de um trem em
movimento causou na plateia comoção e medo. As pessoas, à época, ao verem na
tela um trem em deslocamento acreditaram ser real. Hoje sabemos o poder que o
cinema tem de criar ilusões frente à dimensão ficcional de uma narrativa
(diegese). Através da ilusão fílmica podemos representar como real o que é
apenas uma reprodução rápida e sucessiva de fotogramas projetada em tela em
branco em uma sala escura. É o que chamamos de “ilusão de movimento”. Como diz o
crítico francês Gérard Betton. “a imagem
fílmica suscita certamente um sentimento de realidade”. A realidade estética, afirma Betton, captada pela percepção
humana se mistura íntima e fecundamente à magia, ao sonho, à fantasia e à
poesia. Cinema – secamente falando – é a
arte de transformar o ilusório em verdadeiro.
As emoções que o cinema nos evoca é em grande parte
manipulação que o realizador faz de vários elementos que constituem o universo
diegético. A decupagem e a montagem, o trabalho de câmara, luz e de som, a
forma de construir a história e seu ritmo, e toda a utilização de recursos
técnicos e o uso de códigos e linguagem cinematográficos levam os
espectadores a entrar subjetivamente em seus sentimentos e emoções. Embora não
nos apercebamos, frente a um filme somos colocados em um lugar virtual. Todavia
não confundamos o processo de significação como se o espectador fosse apenas um
receptáculo passivo. A própria história do espectador e seu momento atual de
vida interagem com a recepção expectatória. Assim, percepções, sensações,
emoções, motivações, memórias, desejos e outros processos psíquicos se somam e
se misturam em um complexo contexto de projeção e recepção.
O relacionamento mágico entre
imagem e subjetividade é elevado à quintessência no cinema. Este interjogo
envolve por um lado a ilusão de profundidade e do movimento fílmico, e do outro
imaginação, ideias e experiências anteriores. Se a mente é sugestionável, o
cinema sabe bem explorá-la. O produto cinematográfico que nos é mostrado também
é resultado do olhar de quem o vê. Alguém já disse, inclusive, que o cinema
tornar visível aquilo que geralmente não vemos. Diria, até, que é uma
visibilidade binocular, ou seja, sobre o que está fora de nós e não notamos e o
que está dentro de nós e não nos tocamos.
Entramos tela adentro com o que está dentro de nós. O
filósofo e antropólogo Edgar Morin, por exemplo, denominava isto como um
mecanismo psíquico “projeção-identificação
polimorfa”, fenômeno este onde o expectador não somente se projeta no
ambiente ficcional, mas também o absorve de maneira inconsciente.
A experiência cinematográfica
é, portanto, uma experiência psicológica onde nossas faculdades mentais e
funções estruturais de representação (cognição) são incitadas. Abre-se, assim,
a “caixa de pandora” de nossas imaginações e voamos nas asas virtuais da ilusão
consentida. A fantasmagoria exibida na tela se reveste de nosso mundo interno
projetado conjuntamente aos fotogramas do filme. Christian Metz, um estudioso
da semiótica do cinema, em seu livro “A
Significação no Cinema”, descreve que o espetáculo cinematográfico é “um vazio
no qual o sonho imerge facilmente”.
Considerando que um filme é uma soma de imagens (e de sons também), uma estrutura de signos, a força expressiva da montagem do mesmo liga o expectador e seu olhar à narrativa do mundo ficcional. Todavia, destaquemos que a história contada é um ponto de vista, uma visão que, por sua vez, modela o nosso olhar que assiste a trama como uma espécie de testemunha. Através da manipulação do ponto de vista o olhar do expectador pode ser modelado, assim como sua interpretação. Embora saibamos que o que acontece na tela é um faz-de-conta, atribuímos às imagens características de realidade, envolvendo-nos no contexto da história como se ela fosse de verdade. Levados à ilusão, porém, não nos iludimos tão completamente, visto que são nossas faculdades mentais e investimentos psicológicos atiçados e projetados que dão ao filme uma roupagem de “realidade”. Hugo Münsterberg, psicólogo alemão, pioneiro da Teoria do Cinema, já no início do século XX deu ênfase à ideia do expectador ativo que preenche as lacunas textuais do filme mediante investimentos emocionais e cognitivos. Os eventos mentais que o filme produz não são da esfera do celuloide, mas da mente de quem o assiste. Explica ele que ao assistirmos um filme nos afastamo-nos de todos nossos compromissos cotidianos, e isolados do mundo real e com nossa atenção extasiada percebemos o filme em si mesmo, participando assim do jogo.
Considerando que um filme é uma soma de imagens (e de sons também), uma estrutura de signos, a força expressiva da montagem do mesmo liga o expectador e seu olhar à narrativa do mundo ficcional. Todavia, destaquemos que a história contada é um ponto de vista, uma visão que, por sua vez, modela o nosso olhar que assiste a trama como uma espécie de testemunha. Através da manipulação do ponto de vista o olhar do expectador pode ser modelado, assim como sua interpretação. Embora saibamos que o que acontece na tela é um faz-de-conta, atribuímos às imagens características de realidade, envolvendo-nos no contexto da história como se ela fosse de verdade. Levados à ilusão, porém, não nos iludimos tão completamente, visto que são nossas faculdades mentais e investimentos psicológicos atiçados e projetados que dão ao filme uma roupagem de “realidade”. Hugo Münsterberg, psicólogo alemão, pioneiro da Teoria do Cinema, já no início do século XX deu ênfase à ideia do expectador ativo que preenche as lacunas textuais do filme mediante investimentos emocionais e cognitivos. Os eventos mentais que o filme produz não são da esfera do celuloide, mas da mente de quem o assiste. Explica ele que ao assistirmos um filme nos afastamo-nos de todos nossos compromissos cotidianos, e isolados do mundo real e com nossa atenção extasiada percebemos o filme em si mesmo, participando assim do jogo.
O cineasta russo Pudovkin, que
desenvolveu importante teoria sobre montagem, afirmava que “existe em psicologia uma lei que diz que, se
uma emoção dá origem a um certo movimento, a imitação desse movimento vai permitir evocar uma emoção
correspondente”. Ele mesmo
trabalhava com as questões do tempo, ritmo e tensão para causar uma pressão
emocional sobre o expectador. Obviamente que a utilização e manejo da câmara
nos coloca dentro do filme sobre a perspectiva de quem narra. Deste modo,
pode-se dizer que os olhos de quem assiste um filme se confunde com o olhar da
câmara, dos personagens e do narrador. O olhar, portanto, á a porta de saída e
de entrada do mecanismo mental chamado de identificação.
O fenômeno da catarse (que significa evacuação,
purgação) já era conhecido desde o teatro grego da Antiguidade. Segundo, por
exemplo, Aristóteles, a catarse é a purificação da alma mediante uma descarga
emocional provocado por um drama. E o cinema, como estética e arte, é um grande
veículo para descarrego emocional (do choro ao riso). Através, portanto, de
nossos heróis, vítima ou vilões, evacuamos uma miríade de sentimentos e
anseios, momentaneamente aliviando ou pacificando nossas almas e aflições. Sentindo
dentro, paradoxalmente, expulsamos pra fora nossos fantasmas. Ou como disse o
célebre escritor e pensador alemão Goethe, “o
que está dentro também está fora”.
O cinema nos possibilita,
pois, esta fluidez dos sonhos humanos, afinal o cinema nos dá a impressão de
ter limites nem fronteiras, como dizia o cineasta Orson Wells. Também não é à
toa o que já afirmava Charles Chaplin, isto é: “num
filme o que importa não é a realidade, mas o que dela possa extrair a
imaginação”.
Na sala escura do cinema a alma humana se transporta,
seja para outros mundos, seja para outras personas, seja para outras
biografias. Mas, na verdade e de fato, a alma se transporta é para dentro da
própria alma, lá onde se encontram guardados nossos sentimentos ilhados, nossos
desejos irrealizados e nossos sonhos inconsumados.
Joaquim Cesário de Mello
Genial! Parabéns
ResponderExcluir