O
Iluminismo, o Renascimento e a Modernidade, parecem ter fundado o homem mais sapiens até então criado. É como se acreditássemos que antes só houvesse barbárie, excluindo ocidentalmente o período da Antiguidade
Clássica Grega. A Hipermodernidade, então, nos tornou seres tecnológicos ou
adoradores pagãos da tecnologia. Steve Jobs é o gênio da raça dos tempos que nos
consumem.
Sabedoria
encontra-se associada à erudição, ciência, domínio tecnológico, habilidades
retóricas, logicidade, poliglotismo e sofisticação estética. O mito de Prometeu
faz menção de como o ser humano se sobrepõe aos demais seres viventes: Prometeu
rouba o fogo dos deuses e lhe dá aos homens. Por tal ousadia e transgressão
Prometeu é condenado a ser acorrentado no cume do monte Cáucaso onde diária e
perpetuamente um corvo lhe comia o fígado que depois se regenerava para no
outro dia mais uma vez ser dilacerado. Este mito, portanto, conta a história de
como o ser humano herdou o poder de pensar: do fogo divino roubado.
Quando
um cara se acha sabedor de determinada coisa ele geralmente deixa de olhar com
mais atenção à coisa conhecida. Neste sentido O “eu sei” nos torna míopes ou
até cegos frente ao que se sabe. Um “sábio” dessa forma e maneira é arrogante
que despreza ou não consegue enxergar a própria ignorância. Ainda existem os
opulentos do saber. Estes vivem “arrotando” conhecimento expressos em
malabarismos linguísticos e barroquismos verborrágicos impregnados palavreados
obscuros, herméticos e enigmáticos. Ou como já disse Galileu “falar de forma obscura todo mundo sabe, mas
de forma clara pouquíssimos conseguem”.
A
verdadeira inteligência é aquela que, sabedora humilde de sua ignorância, se
espanta frente à realidade, ao mundo e à vida, e se reconhece não-sabente e por
isto indaga, questiona e busca querer saber o saber que não sabe. O filósofo
renascentista Nicolau de Cusa afirma que “ninguém
é mais sábio do que aquele que se reconhece como o mais ignorante dos homens”.
Para Nicolau de Cusa não há doutrina maior que a sabedoria da ignorância, pois
não há nada mais ciente da essência da verdade que a própria ignorância.
E
por que, então, queremos tanto nos saciar de respostas e no empanturrar de
informações?
É
sabido que excesso de informação (dispersa, vaga, superficial, fragmentada)
consome a atenção do indivíduo. Com o dispersar da atenção e excesso informativo,
temos a diminuição da capacidade de reflexão e retenção na memória de longo
prazo. É como se a memória humana estivesse sido trocada pela memória digital e
virtual. Ou, como afirma o escritor e semiólogo Umberto Eco, tal excesso
provoca amnésia.
Para
mim sabedoria, sabedoria mesmo, é aquela que nos oferece um olhar para além do
imediato e das aparências. Vivemos no corre-corre do dia-a-dia contemporâneo
dos grandes centro urbanos. Pouco observamos as paisagens. Pouco nos damos
conta do que talvez importe de verdade: as pequenas coisas. Vivenciamos um ritmo
tão acelerado que dificilmente a qualidade de nossas parcas existências são
usufruídas em sua mais possível plenitude. Subaproveitamos os dias e a vida.
Para
mim sabedoria, sabedoria mesmo, é aquela que nos transforma, muda nossa relação
com o mundo, com a realidade e com a própria vida. Não é necessário grandes
tratados científicos e/ou filosóficos, nem textos herméticos e enrabuscadamente
escritos. Basta encontrar em nós a simplicidade de se estar vivo.
Encontro
nos escritos do século XIX, de Henry Thoreau, palavras sábias que gostaria de
serem minhas, entre elas: “simplicidade, simplicidade, simplicidade! Tenha dois ou três
afazeres e não cem ou mil; em vez de um milhão, conte meia dúzia... No meio
desse mar agitado da vida civilizada há tantas nuvens, tempestades, areias
movediças e mil e um itens a considerar, que o ser humano tem que se orientar -
se ele não afundar e definitivamente acabar não fazendo sua parte - por uma
técnica simples de previsão, além de ser um grande calculista para ter sucesso.
Simplifique, simplifique." Ou ainda: “somos vulgares, incultos e analfabetos; e,
em relação a isso, confesso que não faço maiores distinções entre o
analfabetismo de meus concidadãos que não aprenderam a ler e o que o que
aprendeu a ler somente aquilo que se destinam às crianças e aos intelectos
medíocres. Uma coisa é ser capaz de pintar um quadro especial, ou esculpir uma
estátua, produzindo assim objetos de beleza; mas é muito mais glorioso esculpir
e pintar a própria atmosfera e a maneira pela qual vemos o mundo. Influir na
qualidade do dia – esta é a mais elevada das artes.”
Simples, assim.
Joaquim Cesário de Mello
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