A
Psicologia, enquanto ciência, a partir do início do século XX direcionou muito
de sua atenção, mormente a Psicologia Clínica, a estudar e tentar entender o
que leva o ser humano a ser depressivo, ansioso, fóbico, neurótico ou psicótico,
enfim a buscar ajudar aquele que sofre. Voltou-se mais, portanto, a temática da
“doença mental” em detrimento à “saúde mental”. Neste sentido temas como
felicidade passou a ser assunto de guetos de prateleiras centradas em livros de
autoajuda. Parece que a questão da felicidade humana era vista pela Psicologia
moderna com certo acanhamento e quase tabu. Basta olharmos para a grande
curricular de um curso de Psicologia para observar que existem disciplinas
do tipo Psicopatologia, Psicoterápicas, Clínica, Psiquiatria e nenhuma cujo
foco seja explicitamente Felicidade. Interessante ressaltar que contribuir para
que um indivíduo seja menos deprimido, ansioso ou neurótico, por exemplo, não o
faz uma pessoa feliz. Ou seja, retirar o que incomoda e faz o sujeito sofrer não
aumenta seu grau de felicidade.
A
Psicologia não deve se envergonhar de cientificamente pesquisar, estudar,
refletir e teorizar sobre felicidade, bem-estar e prosperidade, afinal isso
também faz parte da natureza humana ou, ao menos, do que anseia e busca o ser
humano. Não devemos, é claro, deixar em enfocar os aspectos negativos e
maléficos do existir humano, mas ampliar o entendimento do espectro humano para
também enfocar seus aspectos positivos e autorealizantes. Não sou defensor de
uma mudança de paradigma propriamente dita (do negativo ao positivo), mas de
uma ampliação englobante e plural (negativo e positivo). Vejamos por que.
Peguemos
um copo meio preenchido com água. Haverá pessoas que dirá que ele está meio cheio. Todavia haverá também pessoas que dirá que ele está meio vazio. Existem
pessoas que têm uma tendência a olhar suas vidas pelo lado que lhes falta
e pouco para o que elas têm. Primariamente falando este é um dos indicadores
básicos de felicidade e bem-estar: como percebemos, interpretamos e construímos
nossa visão do mundo. Alguns estudos recentes apontam que cerca de 50% da
sensação de felicidade tem base genética-biográfica. E a outra metade, a metade não
genômica-histórica? Cerca de 10% aproximadamente tem a ver com as circunstâncias da vida
e 40%, por sua vez, do chamado senso de felicidade é resultado de ações e atitudes,
isto é, do que o ser humano faz e age efetivamente em seu cotidiano. Por esta
perspectiva não estar se sentindo feliz não é somente culpa da genética ou do
azar, mas igualmente em nossa capacidade e potencial em superar obstáculos e
vencer dificuldades, afinal obstáculos e dificuldades são obstáculos e
dificuldades e não problemas. Nós é que transformamos os mesmos em problemas.
Sim,
a mente tem poder. Embora o poder da mente tenha seus limites, dentro dos seus
limites ela tem tanto o poder de adoecer e infelicitar a pessoa, quanto de
fazê-la feliz e otimizada, independente das adversidades que a vida nos
oferece.
Ao
longo dos meus mais de vinte anos como psicoterapeuta fui aprendendo com meus
outros que chamo de clientes que a psicoterapia não é uma relação profissional
de ajuda que visa apenas “tratar” de transtornos, mas também auxiliar a esse
outro a desinibir-se, e desinibindo-se avançar com seus potenciais rumo a sua
melhor auto realização. Busquei olhar igualmente para os potenciais,
motivações, sonhos e capacidades adormecidas, descobrindo que a alegria, a
satisfação e a esperança são tão “material clínico” quanto às ansiedades, as
angústias, os medos e a melancolia humana. Coaching, coping e resiliência são conceitos
operacionais que passaram a fazer parte do meu acervo e arsenal
técnico-profissional.
Uma
atitude positiva frente à vida gera emoções positivas. Pessoas que geralmente
restringem ou inibem tais atitudes podem, por exemplo, tentar suprir a falta de
com comportamentos compulsivos, entre eles o de comprar, pois comprar bens materiais
traz prazer, alegria e sensação de bem estar, porém prazeres, alegrias e
sensações de bem estar momentâneos e passageiros. O que nos torna, então, felizes?
Prazer, alegria e sensação de bem estar, todavia prazer, alegria e sensação de
bem estar mais perenes e duradouros. E
como se consegue isto? Embora desde a Antiguidade Grega se saiba parte como, embora
seja simples, muitas vezes temos dificuldades de implementar e botar em
prática. Vejamos.
Primeiro
exercitar a atenção plena, ou seja, o velho e sábio carpe diem romano. Capinar o
dia é viver maximamente o presente. Segundo surfar na experiência (flow), ou seja, permitir-se fluir na
vida, imergir e se envolver no que se está fazendo, sentir prazer na atividade e nos desafios.
Quando se está realmente envolvido em uma atividade ou tarefa com alta
motivação intrínseca não se sente sequer o tempo passar. Como afirma o
psicólogo húngaro Mihályi Cslszentmihalyi quando uma pessoa está em flow-feeling ela utiliza toda suas capacidades e habilidades, experimentando enorme satisfação e prazer pessoal.
Outro recurso que podemos utilizar é o degustar e apreciar as coisas boas da
vida, sem pressa ou açodamentos. A atenção plena, o se permitir fluir e o
saborear o instante faz a nossa vida ser sentida de maneira muito mais
interessante.
Paralelamente
ao embatimento das dores construídas desde o passado e da visão negativista que
podemos ter de nós mesmos e do mundo a partir de nossa infância, há de se
buscar o fortalecimento dos aspectos funcionais da personalidade. Enfocar e
estimular as emoções positivas fortalecem não somente o ego e o self da pessoa,
mas também até mesmo o sistema imunológico do mesmo. E o que são emoções
positivas? Alegria, serenidade, tranquilidade, contentamento, amor, esperança,
são exemplos de emoções positivas.
Os
fatores salutogênicos são e devem ser trabalhados em psicoterapia, além dos
fatores patogênicos. Por salutogenia se entende aspectos inerentes à
personalidade, bem como hábitos considerados saudáveis para o sujeito, tais
como atividades físicas, práticas de esporte, bom nível de lazer, hobbies, boa
alimentação, amigos e rede social satisfatória. Um indivíduo sofrente apresenta
um desequilíbrio na balança entre os fatores patogênicos e salutogênicos, com
inclinação para o polo patogênico. O reequilibrar-se não é somente diminuir o
peso da patogenia, mas igualmente aumentar o lado da balança pertencente à
salutogenia.
Toda
boa psicoterapia visa (além do alívio sintomático e/ou resolução de
situação-problema porque passa o paciente/cliente) elevar as forças pessoais já
existentes no sujeito, reconhecendo os comportamentos adaptativos que servem de
proteção a futuros estressores e dificuldades. É como se fortalecesse a pessoa
para outros possíveis enfrentamentos na vida, dando espaço ao florescimento de
um sujeito antes obstaculizado em seus potenciais adormecidos. Uma pessoa assim
mais fortalecida e mais autêntica e mais realizada é, inevitavelmente, mais
autoconfiante e mais engajada com a vida e traz consigo uma autoimagem menos
negativa e, consequentemente, mais positiva. Embora isto tudo não seja garantia
de felicidade, não se é feliz sem isto. E o isto aqui empregado resume-se em um
sentido mais satisfatório de vida. Com sentido de vida o sujeito se motiva para
a própria vida e aprofunda sua própria existência.
Breve, em nova postagem, demonstraremos algumas técnicas mentais que auxiliam no desenvolvimento positivo do nosso psiquismo.
Breve, em nova postagem, demonstraremos algumas técnicas mentais que auxiliam no desenvolvimento positivo do nosso psiquismo.
Joaquim Cesário de Mello
Adorei o post. Fazia tempo que não lia o blog e voltar a lê-lo com essa publicação foi instigante.
ResponderExcluirSempre pensei na importãncia de perceber esse outro lado e realmente na academia é visado mais os aspectos negativos da vida, talvez por isso a imagem contruída sobre o profissional de psicologia como alguém que lida com dano e dor, na verdade somos profissionais da existência humana, ou seja, tudo que ela tem a oferecer.
Maravilhoso, isso é a clínica, assim que deve ser. Maravilhosas lições e direcionamentos para um trabalho efetivo e um auto trabalho. espero as dicas.
ResponderExcluirMuito legal.
ResponderExcluirEstou mim aprofundando no estudo da psicologia e talvez vou estudar e mim formar nessa área