Jorge Armando
Interessantíssimo os recentes
posts de Joaquim Cesário de Mello, principalmente os titulados RAÍSES
PSICOLÓGICAS DA PSICOTERAPIA e RECITAR-SE: UMA PEQUENA ODE AOS PSICÓLOGOS DO
AMANHÃ. A partir deles arvoro-me em expor também aqui minha visão e leitura
sobre a formação atual dos psicólogos.
Primeiramente
há de se destacar que de tempos em tempos vivemos períodos de moda onde, por
meio da academia e da mídia, hegemoniza-se uma determinada escola de pensamento
em detrimento das demais. Sou de uma época em que o modismo era a Psicanálise
ou mais precisamente a psicanálise lacaniana. Ainda peguei os estertores da
biodança e do movimento bioenergético. Depois veio a Psicoterapia Breve e agora
temos a TCC.
Como
todo e qualquer modismo o que se faz é comprar, falar, fazer e ser o que a
tendência dita, ou seja, ser como todo ou quase todo mundo (efeito manada).
Talvez isso se deva a nossa forte necessidade de se sentir pertencente.
Receamos nos colocar à parte do todo e acompanhamos a maioria cegamente por
temer sentimentos de exclusão social, embora para tal venhamos a pagar um alto
preço que é nos tornarmos pessoas unidimensionalizadas. O termo “homem
unidimensional” foi utilizado pelo filósofo Herbert Marcuse para falar do ser
humano inserido em uma sociedade industrial moderna que através de sua
racionalidade tecnológica de dominação oprime as massas e controla e tolhe as
consciências humanas. Na satisfação das necessidades artificiais vive-se, pois,
a “mecânica do conformismo”. O homem unidimensional, segundo Marcuse, é um
consumista acrítico que dominado vive dependente das máquinas e da tecnologia,
sendo assim, portanto, um ser coisificado que apenas vê a superficialidade das
coisas e do mundo e não sua essência.
Marcuse
pode ser considerado, com justa razão, o pensador e o filósofo da contracultura
e sua influência sobre a juventude da geração que me antecedeu foi marcante.
Pena que seu nome sequer seja conhecido pelos jovens de hoje – e não é pra
menos. Até porque basta indagar a qualquer universitário médio quem, por
exemplo, pintou a Capela Sistina, ou o que representou o Iluminismo na história
da humanidade, ou quem escreveu A Montanha Mágica, ou quem foi Sêneca ou Albert
Camus, para termos como resposta um subnutrido silêncio de quem não sabe. Agora
pergunte a esse mesmo estudante universitário quem criou o Pato Donald, o que
significa Apple, quem é Ivete Sangalo ou qual é o nome da novela das oito da
Globo e terá uma imediata resposta. Pode apostar: pegue um cara de ciências
humanas, de exatas ou de ciências sociais que praticamente dará no mesmo.
Mas
quer-se o que, afinal? São jovens já nascidos dentro de uma Sociedade de
Consumo e de Espetáculo. Desde tenramente respira-se a cultura do narcisismo e
a lógica da vida é a lógica Mcdonaldiana do fast
food. Engorda-se de batatas fritas, hambúrgueres e frituras várias, ao
tempo que se emagrece de cultura, erudição e densidade. Zygmunt Bauman é quem
tem razão: estamos nos liquidificando cada vez mais em uma modernidade cada vez
mais líquida. E pensar que a qualidade dos professores, dos alunos e das
faculdades e universidades estão formando o profissional que um dia iremos
procurar ou necessitar amanhã. Deus tenha piedade de nossas almas.
Não
vamos chamar essa grande leva de estudantes secundários ou universitários de
“burros”, pois a questão não é cognitiva, mas sim de uma estupidez socialmente
construída. A grande maioria, mas a grande maioria mesmo, é constituída de
pessoas massificadamente formadas para serem “pobres de espírito” e “doutores
iletrados”. O analfabetismo funcional impera, embora esses mesmos “analfabetos
passivamente criados” nem sabem ou se percebem como tais. Diz um antigo
provérbio popular “em terra de cego quem tem olho é rei”. Também já dizia
Nelson Rodrigues (dramaturgo brasileiro – caso algum universitário médio esteja
por aqui lendo - e um dos principais nomes do teatro moderno) “toda unanimidade é burra”. Claro que há
exceções, mas é uma minoria cada vez mais rarefeita.
A
estupidez vigente não é em si falta de inteligência, porém falta do exercício
da mesma. Talvez fosse melhor falarmos de ignorância. É, ignorância é palavra
mais pertinente, por isto retiremos o termo estupidez. Fiquemos com ignorância
que pelo Wikipédia (a Barsa dos tempos atuais) é “a falta de conhecimento,
sabedoria e instrução sobre determinado tema”. A subnutrição cultural, o
raquitismo intelectual e pobreza crítica é a nossa nova geografia da fome.
Mas,
venhamos e convenhamos, deve-se limpar um pouco a barra dos coitados alunos de
então. Observem mais nitidamente a pedagogia sonrisal. Muitos professores são
tão e quanto subalimentados e subalimentadores, basta uma expressão aqui e
acolá em inglês que já é quase chamado de gênio. Na farsa em que se tornou o
ensino universitário se tirar o data show ele (ou ela) se perde todo. Se
espremer o bicho num sai mais de que algumas gotas e olhe lá. O professor finge
que ensina, o aluno finge que aprende e a faculdade finge que forma. E todos
ficam felizes.
Quer
um exemplo? Vamos lá. Adentre e caminhe pelos corredores de uma universidade ou
faculdade e olhe os livros que os estudantes estão carregando ou lendo. Tá, já
sei o que você vai dizer, é muito raro um estudante em uma faculdade com um
livro, exceto nos dias de prova quando a biblioteca fica cheia, bem como as
filas de xerox. Mas faça um esforço, afinal podemos achar alguém ou algum. Caso
se ache, tente ver o título e o autor do livro. É muito provável que o que se
encontre são livros de vários autores, ou seja, os chamados livros com um ou
dois autores responsáveis pela organização – o famoso “orgs”. Se puder abri-los
logo você verá que cada pretenso autor tem em torno de 10 páginas. Não, não há
teoria se construindo dentro deles, apenas reprodução (muitas vezes ralas) do
resumo do resumo da ópera.
Um
olhar mais agudo e atento haverá de enxergar um monte de professores defasados,
muitos inclusive que basta pegar uma xerox de caderno do ano anterior que você
já tem em mãos todas as aulas. Este quadro todo só faz alimentar ou retroalimentar
o silencioso e perverso fenômeno do analfabetismo funcional. Uma considerável
quantidade de alunos apresentam significativas deficiências em sua capacidade
de decodificar minimamente textos e livros. Desse modo cai-se o nível de
complexidade desenvolvida nas salas, chegando-se até às beiras do rudimentar,
pois assim o corpo docente se sente satisfeito por achar que está entendendo ou
realmente aprendendo alguma coisa.
Certa
vez em uma palestra de Joaquim Cesário (provável que ele nem se lembre mais)
ouvi ele associar a vida com o espetáculo da semana santa em Nova
Jerusalém quando dizia que na vida ou
somos atores principais, ou coadjuvantes ou figurantes como aqueles que apenas
acenam os ramos no passar do jumento carregando os principais protagonistas.
Pois é, cabe a cada um fazer suas escolhas e com elas seus esforços: se será um
ator principal, um coadjuvante ou se vai passar a existências balançando ramos.
Fico feliz em saber, como afirma
Joaquim, que ainda temos nas salas de aula pessoas decididamente comprometidas
com suas escolhas profissionais e acadêmicas. Que ainda há luzes no fim do
túnel e que, assim como ele, poderei no futuro encaminhar com mais sossego,
confiança e tranquilidade meus netos a algumas pessoas que hoje são os psicólogos
do amanhã. Só peço a ele seus telefones e endereços.
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